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sábado, 14 de dezembro de 2019

Sobre Messias e Jesus




Senhor Capitão Jair Messias Bolsonaro

Presidente do Brasil

Senhor:

Sabedor das atribulações pelas quais seu governo está passando, mesmo depois das reformas que vão fazer sumir com as aposentadorias do povão;

Sabedor também das decepções produzidas pela eminente volta de Cristina Kirchner ao Poder na Argentina;

E das aborrecidas intervenções perpetradas todo dia por fundamentalistas do verde, tentando impedir que se reproduza o agradável som das motosserras nas florestas;

E, nesse mesmo capítulo, sabedor dos entraves colocados à extirpação de áreas destinadas aos incultos e perniciosos índios;

E sabedor, ainda, da injusta imputação de que o senhor é o seca pimenteira do glorioso Palestra Itália, apenas e tão somente por ter recebido das mãos do técnico Felipão (nosso bravo comandante no 7 X 1) a taça de campeão paulista;  

Sabedor, finalmente, de que o Planalto monitora, aflito, os movimentos populares que estão irrompendo mundo afora (Chile, Bolívia, Hong Kong etc., etc) e, com isso, provocando danos razoáveis às funções intestinais no comando do Planalto, com maior incidência entre militares, é claro.

Sabedor de tudo isso, venho apresentar uma sugestão que, segundo creio, poderá colocar o país nos conservadores trilhos que V. Exa. planeja com seus auxiliares.

As vantagens da contribuição é que nela não se verão configurados óbices políticos e burocráticos, pressões do Legislativo, intempestivas chiações da esquerda irresponsável e protestos conservacionistas nas portas da Abadia de Westminster. 

Devo avisá-lo de que se trata de uma solução restrita a países (na realidade temo que estejamos sós nessa posição privilegiada) que possuem interlocutores diretos com o poder celestial.

Estou me referindo, claro, a Sra. Ministra da Mulher Damares Alves que, sabemos todos, há algum tempo teve um encontro com Nosso Senhor Jesus Cristo nas proximidades de uma goiabeira.

Segundo soubemos pela própria Sra. Alves, sua participação nesse encontro foi de suma importância para evitar um pequeno acidente, que poderia causar consternação a toda humanidade, já que o Senhor Jesus estava prestes a cair do galho da goiabeira em epígrafe.

Sinceramente, senhor presidente, não sei o que o filho do bom Deus dos católicos estaria fazendo num perigoso galho de goiabeira e tenho muitas dúvidas de que uma personagem capaz de caminhar sobre as águas, segundo textos da bíblia católica, corresse qualquer risco de cair da goiabeira.

Mas respeitemos os temores da Sra. Damares.

Tendo a presidência da República, nesse momento sob sua tutela, minha sugestão é usar o canal da Sra. Damares para um novo encontro com Jesus.

Pode também o governo, à guisa de reconhecimento, prometer à ministra que vai solicitar aos fabricantes de roupas infantis o uso exclusivo, a partir de agora, das cores azul, para meninos e rosa para as meninas. Talvez surjam problemas com algumas grifes, mas tudo contornável, creio.

Sugiro, portanto, que o senhor peça a Sra. Damares um segundo encontro com Jesus Cristo, desta vez com a sua participação e de pessoas de sua confiança.

Nessa conferência poderão ser solicitadas da autoridade celestial, infalíveis soluções para o país.

O senhor poderá então, solicitando regime de urgência celeste, pedir que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seja prontamente remetido para as brancas pradarias siberianas onde, confortavelmente, esperamos, poderá papear agradavelmente e pelo resto de seus dias sobre o socialismo real, na companhia de renitentes comunistas também enviados para aquela aprazível estação de inverno depois da queda do muro de Berlim.

Sei ainda de suas preocupações com os desabotinados* do STF que, de repente, soltaram o Lula e ameaçam prender o Moro e o Dallagnol.

*preferi não usar a palavra “aloprados” que, como sabemos todos, faz parte do glossário petista.

Bem, presidente, embora ninguém no mundo saiba como deverá ser uma recepção ao Todo Poderoso, creio que a informalidade deve dominar o encontro.

Assim, sugiro que o senhor mande colocar cadeiras confortáveis no Jardim do Palácio. (Qualquer evidência de goiabeiras por perto deve ser imediatamente eliminada!!!)

Jesus, pelo que aprendi nos catecismos, prefere os ambientes abertos a coisas que lembrem repartições romanas na Palestina.

Também soube, outro dia, que o Filho de Deus tem meios próprios de locomoção e por isso não haverá necessidade do senhor mandar buscá-lo num jato da FAB.

Quanto ao protocolo propriamente dito, minha percepção indica que deverá ser o mais simples possível, mas não podemos esquecer que Jesus bebe vinho. Por favor, pergunte a assessores mais graduados que escolham o ano da safra. E come pão. Escolha, por favor, uma padaria decente aí em Brasília. Peixes também poderiam, talvez sob a forma de pastinhas para passar no pão, ser incluídos no repasto.

Quem sabe depois dos cumprimentos formais – o senhor não precisará identificar-se, pois é certo que Jesus conhece seu rebanho – os dois possam dedicar alguns segundos a um trivial papo sobre futebol? Taça Libertadores e coisa e tal... Não, melhor deixar pra lá, presidente, Jesus, dizem, é sócio torcedor do Flamengo, com participação mais ou menos ativa nas festas na favela.

Nesse capítulo introdutório aos pedidos de intervenção celeste, seria de bom alvitre evitar a sua preferida escolha de piadas sobre pênis japoneses. Afinal, foi o pai do homem, que estará a sua frente, o criador do gênero humano e, como seu filho, com certeza conhece sobejamente a métrica dos instrumentos de procriação asiáticos.

Sugiro também, que o senhor não exiba aquele vídeo que postou durante o último carnaval, mostrando esguichos de urina prodigalizados por gays festeiros durante a festa pagã. Sei que o senhor só o fez pelo interesse que tem em mostrar à autoridade celestial os males e as exorbitâncias que acontecem durante o período, mas é bom lembrar que Cristo ainda não se bandeou para as hostes neopentecostais que reivindicam o fim do chamado Trio Momesco.

Depois de sua exposição, que não deve ultrapassar dez minutos, já que alongado o período Jesus corre o sério risco de ouvir o senhor dissertar sobre os infames radares nas estradas, a indústria de multas ou ainda sobre a ridícula lei que obriga o uso de cadeirinhas para crianças nos automóveis.

Como não creio que Cristo compartilhe de suas convicções, sugiro uma eficaz intervenção de Dona Damares providenciando alguns docinhos para que Nosso Senhor possa ter uma ideia dos sabores de Brasília.

 (Atenção, Dona Damares, é preferível a senhora perguntar se o repasto servido deve ser kasher!!!) É bom lembrar que, antes de ter provocado Caifás e ser crucificado pelos romanos amigos dele, Jesus era judeu.

É mais provável que, premido pelas circunstâncias de ter se transformado em ícone dos cristãos, Jesus tenha abolido a comida judaica.

Então, presidente, passados os primeiros momentos e feitas as reivindicações de seu governo, é hora de assomarem ao encontro o hábil astrólogo Olavo de Carvalho e o bravo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Henrique Fraga Araújo.

Eles estão, já se sabe, ansiosos para revelar ao bom Jesus que, ao contrário do que se pensa, a terra é plana, Galileu Galilei, Nicolau Copérnico e os Fernãos de Magalhães da vida, segundo os dois sábios, não passam de idiotas.

E quanto aos astronautas que dizem que a Terra é Azul são apenas atores de segunda linha, trabalhando em montagens cenográficas do Canal Discovery, produzidos nas cercanias de Piccadilly Circus, mais exatamente nos estúdios da BBC de Londres e exibidas na TV por assinatura.

Jesus é paciente, todos nós sabemos, mas a essa altura do campeonato poderá estar pensando que seu pai, o criador, pode ter cometido um engano quando calibrou errado a Inteligência de cabeças coroadas do Planalto.

Ou talvez, num momento de desatenção, quem sabe, o cérebro das mulas de Nazaré tenha sido transplantado, por engano, para titulares dos ministérios em Brasília.

Eis, senhor presidente, minha (me recuso a achar modesta) contribuição para seu governo.

domingo, 16 de junho de 2019

Sobre C. Wright Mills e a classe dominante brasileira




O sociólogo americano C. Wright Mills foi o autor de A Elite do Poder best seller que, na década de 50, balizou atitudes da esquerda americana de então. Os rapazes e moças que nas universidades resistiram à Guerra do Vietnam, anos depois, eram um pouco filhos dessa literatura, que incluía outras vertentes é claro.

Logicamente as mudanças sociais acontecidas entre os anos cinquenta e a segunda década do século 21 são profundas.

De lá para cá houve o encolhimento da Guerra Fria, a sobreposição do setor financeiro sobre o produtivo, o fim das viagens espaciais e o crescimento irreprimível da internet. Mas alguma coisa permanece.

Mills dedicou pelo menos um capítulo a rapaziada que, de cima de um monte de grana, tem poder de decisão sobre a vida da maioria e mostrou como isso se exerce.

Para o sociólogo os muito ricos dos anos 50 não eram os homens e mulheres que frequentavam as páginas da Harper’s Bazaar  e as notas na coluna de fofocas de Louella Parsons. (Uma menção de três ou quatro linhas a endinheirados exibicionistas custava os olhos da cara).

Essa gente dourada que esquiava nos Alpes Suíços, era proprietária de automóveis modelo exclusivo e iates de grande calado, casava-se com astros e estrelas de Hollywood e passava férias na Cote D’Azur, saia por aí mostrando ao mundo como era gostoso o sonho americano. Aos olhos das classe médias eram os donos do mundo.

Mas os verdadeiros senhores do Poder, por trás da intrincada rede de articulações a que normalmente chamamos de Política, estavam muito acima. Tinham mais grana ainda.

A maneira como se formavam as relações que permitiam um grupo de ricaços dirigir os partidos Democrata e Republicano não cabe num texto sobre o Brasil de hoje.

No nosso caso - são outros os tempos e as condições dadas - a Elite do Poder não faz questão de transitar nas sombras e não se incomoda de ver publicados números da Oxfam. A ONG inglesa  , que mostra o Brasil fazendo parte do clube dos mais desiguais do mundo. Outros sócios são: Quênia, África do Sul, Namíbia, Botsuana, República Centro Africana, Zâmbia, Lesoto, Colômbia, e Paraguai.

Mas da mesma maneira que ricos americanos na ponta da tabela, a classe dominante made in Brazil também sabe como pode e deve intervir em momentos, como no atual, em que a economia está caminhando a passos largos para o brejo, pondo em risco o que ela, como classe, acumulou até agora. Ou recebeu por herança.

Os ricaços brasileiros achavam que, quando decidiram o afastamento de Lula das eleições de 2018, estaria pavimentada a volta dos tucanos ao poder. Isso apesar de algumas de suas melhores referências estarem sendo moídas nas páginas das reportagens policiais.

Lula foi afastado do pleito, mas a coisa não deu muito certo. O Deus dos cristãos – segundo palavras do próprio eleito – colocou no poder um seu representante.

Tal proeza divina incluiu por tabela a entronização no ministério de uma senhora que tem audiências com Jesus Cristo, um ministro com capacidade de ler nas entrelinhas de um prato da culinária árabe, e outro que dirige um programa de acusações aos adversários, ensinando a seus “subordinados” como vai julgar o material que estão aparelhando nas salas do chamado Ministério Público.

Isso sem falar em Olavo de Carvalho, o guru do Presidente da República com autoridade para demitir ministros de Estado. Quando seus estudos - sobre a certeza que o planeta Terra é absolutamente plano - podem ser deixados de lado, Carvalho entrega-se ao esporte de dedicar palavrões a militares, seus desafetos, no Planalto.

Fica um pouco difícil investidores aplicarem seus dólares em um país governado por pessoas cuja sanidade mental e o nível de conhecimento para o cargo são, no mínino, discutíveis.

É ainda mais complicado quando tomam conhecimento das sólidas preocupações do presidente: armar a população, criar o peso real, liberar a caça a animais silvestres, retirar radares das estradas, deixar impune motoristas que não carregam crianças na cadeirinha, criticar o Poder Judiciário por ter aprovado legislação que considera homofobia crime e vai por aí que a lista é grande.

E mais: europeus não gostaram nem um pouco das medidas que praticamente extinguiram toda a proteção ao meio ambiente no território brasileiro. Mas, nesse capítulo, Bolsonaro deve voltar atrás rapidinho. Como aconteceu quando do projeto de levar a embaixada brasileira para Jerusalém.

Os europeus depois da China e Estados Unidos são um importante parceiro comercial do Brasil.

É bom lembrar que não é muito difícil colocar em pauta o impeachment de Bolsonaro. Os pretextos sobram: a parceria de um de seus filhos com o crime organizado no Rio, o acordo com Sérgio Moro para inviabilizar a candidatura de Lula e detalhes outros que deverão aparecer no momento certo. Ou já estão aparecendo.

A classe dominante só tem a ganhar trocando Jair Bolsonaro por Hamilton Mourão e trazendo o PSDB de volta ao Executivo. Pode inclusive retomar o projeto de reforma da Previdência.

E é bom lembrar que Mourão vem se oferecendo diuturnamente para assumir com os tucanos.

Então pouco importa se a classe média acredita que o site Recept Brasil é um conluio do PT para desestabilizar Bolsonaro. Os verdadeiros donos da grana pouco se lixam para seus parceiros de segunda classe.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Conteúdo do Intercept vira assombração para Lava Jato




Há um dado interessante a ser considerado no tsunami provocado pelas denúncias do site Intercept Brasil.

Ninguém contestou o conteúdo das conversas entre Moro e Dallagnol. O destaque foi para a forma como foram obtidas.

A grande mídia apontou suas baterias para a ilegalidade na captação dos diálogos, Moro e Dallagnol dizem que não fizeram nada demais e bola pra frente.

Pois é, a bola seria tocada pra frente sem maiores delongas – como foi no caso do telefonema entre Lula e Dilma Rousseff grampeado pela PF – se outros elementos não fossem adicionados ao imbróglio político.

Na opinião desse humilde escrevinhador não há fato jurídico capaz de se sobrepor ao fato social, ao fato político, histórico. Ou seja: as leis mudam de opinião ao sabor dos ventos do poder.

Um exemplo ainda próximo foi à capitulação vergonhosa de ministros do STF logo após o golpe do dia 1º de abril de 1964.

A constituição de 1946 teve o mesmo uso do papel higiênico. (Talvez não, porque tinha sido impressa em papel off set um tanto espesso).

Todo o chamado arcabouço jurídico, incluídas as cláusulas pétreas, seguiu em marcha batida para o esgoto e a rapaziada de plantão no STF passou a aprovar, com louvor, toda a legislação autoritária imposta pelos militares que chegaram ao Planalto. Inclusive a pena de morte, lembram?

Favorecido pelos ventos bolsonaristas, o então juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato deliberaram que o papel onde está impressa a Constituição de 1988 talvez possa ser utilizado para a mesma finalidade.

E é até possível que Moro ganhasse mais alguma condecoração pelo estupro da chamada Carta Magna, mas os tempos são outros.

Os primeiros meses de seu parceiro (e Criatura, porque não) à frente do Executivo estão sendo desastrosos e as imbecilidades explicitadas no dia a dia do Planalto – logo removidas pela ação de deputados e senadores – deixam a classe dominante de cabelo em pé, assustada com os rumos que vai tomando o país.

Obviamente banqueiros, grandes proprietários de terras, empresários, executivos de multinacionais desejam ardentemente jogar nos ombros dos segmentos mais pobres da população o peso de uma eventual recuperação da economia. (A aprovação da reforma da Previdência faz parte dessa pauta).  

Mas sabem também que isso não é tudo. A saída, estão carecas de saber, passa pela recuperação do emprego, e do mercado interno.

Ou seja, passa pela redução das desigualdades, tema não muito bem digerido por essa rapaziada.

Quando Bolsonaro pede a empresários que deem “um norte para o governo” (foi num encontro com lideranças da classe ontem em São Paulo) a classe dominante fica ainda mais certa do que já desconfiava: o Brasil é uma caravela que navega alegremente em direção á tempestade.

Infelizmente para Moro, Dallagnol & Cia o conteúdo do Intercept vai continuar assombrando suas vidas.











  

Mais uma do Jair




O presidente Jair Bolsonaro exonerou os onze integrantes do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à tortura, sinalizando que a prática utilizada, geralmente, contra jovens pretos e pobres nas delegacias Brasil afora está digamos... liberada.

Mas atenção: as classes médias bolsonaristas vão precisar ficar mais atentas ao comportamento de seus rebentos. Isso porque a polícia agora vai ampliar o leque dos que “podem” ser... digamos "tratados sem maiores deferências". Incluindo aí a garotada petulante que costuma desafiar os homens da lei, lembrando que são filhos de gente bem postada nas hierarquias da república, que a família tem dinheiro, etc, etc.

Mudando de assunto, pessoas já falecidas da minha família, família conservadora é bom que se diga, atribuíam a Washington Luis (1896/1957) a frase: “governar é abrir estradas.” Não tenho certeza de que o candidato eleito à presidência da República em 1926 e derrubado pela Revolução de 30 seja realmente o autor da afirmação, mas vou me servir dela para tentar jogar uma luz sobre a situação atual.

Para o capitão Jair, “governar é deletar o PT”. Faz sentido, porque enquanto o país afunda numa recessão que vai durar alguns anos, ao invés de tentar buscar soluções, o presidente se mostra muito preocupado com remoção de radares nas estradas, extinção de sanções a motoristas que conduzem crianças sem uso da cadeirinha e a motociclistas sem capacete, fim da legislação contra desmatadores, apoio a liberação da caça, corte nas verbas para universidades e dezenas de outras medidas atribuídas à lavra dos petistas.

Que o capitão não tem a mínima condição de gerenciar o país, todos já estamos cansados de saber. Ele mesmo já disse que gostaria de seguir a carreira militar mas, infelizmente, foi impedido depois que apresentou um plano terrorista para intimidar esquerdistas & afins. Seus superiores não gostaram muito e, gentilmente, defenestraram Jair que... virou deputado.

A série de imbecilidades protagonizadas nos seus pouco mais de 100 dias de governo, a qualidade de seus auxiliares diretos - Moro, seus “conjes”, e sua promiscuidade com Procuradores da Lava Jato, Weintraub, o gourmet capaz de ler nas entrelinhas de uma Kafta e a senhora Damares e suas audiências com Jesus Cristo - sugerem que o governo está à deriva e dificilmente conseguirá emplacar a pauta de Paulo Guedes.

Mas é bom lembrar aos oposicionistas de todos os matizes: não saiam por aí comemorando. Sai Jair Bolsonaro, entram Hamilton Mourão e a rapaziada do PSDB. Sai um imbecil, entra um militar conservador, capaz de continuar a conduzir, sem sustos, a pauta da classe dominante.


terça-feira, 11 de junho de 2019

Por que só agora?




A pergunta é: por que toda a farsa montada pela dupla Moro/Dallagnol só agora veio a público?

(É claro que só mesmo os desconectados com a realidade e fascistas de carteirinha acreditavam que o impeachment de Dilma Rousseff, e a cassação da candidatura de Luis Inácio Lula da Silva não fossem um movimento político).

Mas por que só agora a farsa começa a ser desmontada? É simples. A destruição do PT, um dos objetivos da classe dominante não deu o resultado esperado.

Ao invés de aumentar a popularidade já combalida dos conservadores do PSDB, a farsa fez vencedor das eleições de 2018 um candidato, que prometia, através de uma postura tendente a ditatorial, acabar com as mazelas da recessão que acomete o país nesse momento.

Deu certo para segmentos com menor possibilidade de digerir informações. Acossados pelo aumento da violência setores da baixa classe média e moradores de comunidades apoiaram a solução de mais violência contra o banditismo.  

A classe dominante não perdeu tempo. Depois do frustrante 1º turno passou a apoiar, sem tergiversações o candidato da direita radical, esperançosa de que os custos de uma eventual recuperação da economia fossem lançados nos ombros dos pobres e da pequena classe média.

A verdade é que a classe dominante e grupos de direita nascidos da recessão não tem a menor ideia de como tirar o Brasil do atoleiro. Embarcaram na reforma da Previdência - um presentão oferecido aos banqueiros - porque não viam alternativa a vista.

(A bem da verdade desconfiam que a saída para a crise passe pela redução das desigualdades, com o consequente crescimento do mercado interno. Mas como herdeiros diretos dos “Homens de Grossa Aventura” que aqui chegaram com D. João VI, tem dificuldades com pautas inteligentes).   

Não há a menor possibilidade de uma reforma da Previdência tirar o Brasil do atoleiro. Não há qualquer conexão entre uma coisa e outra.

Como propaganda a reforma é parecida com a salvação do país proposta por Collor de Melo nos anos 90, com sua campanha de “caça aos marajás”.

Como Collor que confiou em Zélia Cardoso de Mello, - uma personagem surgida na campanha presidencial e que, na falta de alguém com um mínimo de competência, acabou ministra da Fazenda - Jair Bolsonaro agarrou-se a figura de Paulo Guedes, uma Zélia de calças compridas, também desconhecido do respeitável público.

Passados pouco mais de cem dias a classe dominante começou a ver que as coisas não eram como pensavam ao apoiar Bolsonaro. Logo logo começou a ficar claro que o presidente eleito não tinha um mínimo de capacidade para gerir uma economia grande e complexa como a brasileira.

Governar para Bolsonaro é, única e exclusivamente, deletar tudo o que o PT fez em seus mais de 12 anos à frente do Executivo. E só. O capitão Jair, aliás, sabe que é perfeitamente incapaz de gerenciar o Brasil. Já disse isso mais de uma vez, lembrando que foi Deus que o colocou na cadeira presidencial e que seu desejo real era ser militar etc, etc.

O problema é que a série de imbecilidades cometidas até agora estão reduzindo as possibilidades de aprovação da reforma, mesmo desfigurada por deputados e senadores, também eles sabedores das extremas limitações do capitão.

Diante desse quadro e na impossibilidade de conseguir impor a reforma da Previdência, a classe dominante parece não ter outra alternativa senão substituir o presidente pelo vice Hamilton Mourão.

Antes que a derrubada seja feita pelas manifestações de rua.

O primeiro passo foi observar passivamente a divulgação das manobras da dupla Moro/Dallagnol.  Globo, Folha & assemelhados abriram espaço, generoso, para as matérias do site Intercep.

Moro é o principal fiador da aventura bolsonarista e sem ele, que é ainda mais popular que o presidente, as coisas se complicam.

Pode ser um tiro no pé. Porque a queda de Bolsonaro não necessariamente vai colocar na presidência um nome conservador do PSDB.

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quarta-feira, 22 de maio de 2019

Conservadores substituem idiotas e bola pra frente



Quanto mais durar a sangria de Jair Bolsonaro, maiores serão as chances do próximo governo adotar posturas tão ou ainda mais progressistas do que as administrações de Lula e Dilma. É uma afirmação que parece destoante, mas talvez se aproxime mais da realidade dos dias de hoje do que pensam alguns colunistas de plantão nas redações.

Isso porque a classe dominante, empresários, grandes acionistas, executivos de multinacionais, banqueiros, rentistas & assemelhados não está nada satisfeita com o desempenho do ex-capitão e seu grupo.

Bolsonaro foi, logo de cara, olhado com certa relutância por essa rapaziada, depois que seu candidato, Geraldo Alckmin, revelou-se um fiasco nas eleições de 2018. A classe acabou tendo que engolir o sapo.

As coisas pareceram melhorar quando Bolsonaro acenou com uma reforma da Previdência que joga sobre os ombros da população mais pobre a solução para o gigantesco déficit orçamentário do governo. A classe dominante adorou.

Mas Bolsonaro não vai poder cumprir o que prometeu. E a elite do poder já sabe disso.

A alternativa Mourão está posta e o presidente e seus filhos começam a ver que seus amigos da primeira hora já estão pulando do barco.

Para o povão, que acreditou na promessa de extinção da bandidagem através de uma política de western spaghetti “atiro primeiro, pergunto depois”, a constatação é ainda mais dolorosa.

Os criminosos que transformam suas vidas em inferno diário não reduziram sua atividade, apesar da presença do exército nas ruas, e a polícia passou a bater recordes de homicídios em favelas e bairros pobres da periferia das grandes cidades. Os números foram divulgados essa semana pela Rede Globo.

Assaltos a caixas eletrônicos e a caminhões de carga seguem crescentes nas estatísticas apesar de pantomimas como a do governador do estado do Rio de Janeiro Wilson Witzel mostrado na TV a bordo de um helicóptero da polícia durante um tiroteio com mortes na favela da Maré.

A corrupção, mote usado desde os anos 40 para justificar golpes de estado na América Latina, e a chamada Operação Lava Jato começam a se voltar contra seus propagandistas. As ligações perigosas do clã dos filhos do presidente com as milícias do Rio estão na ordem do dia.

Resta saber quem está apoiando os policiais e procuradores que investigam Flávio Bolsonaro, Queiroz & assemelhados.

Enquanto o povão assiste um pouco atordoado ao desmoronamento do governo, movimentos estudantis, operários, artistas, intelectuais, funcionalismo público e outras categorias, iniciam o processo de recuperação, após um longo período de dormência, e se preparam para confrontar o poder, num cenário em que o presidente da república vai ficando a cada dia mais isolado.

Isso porque, a constatação é clara: Bolsonaro com suas extremas limitações acreditou que governar era extinguir todo e qualquer movimento que confrontasse sua índole fascitoide, fazendo dele uma espécie de paladino de uma estranha “democracia”, em que escolas são militarizadas, desaparece o ensino de Ciências Humanas, muda radicalmente a postura da defesa do meio ambiente, gays são exorcizados, negros e mulatos são posicionados “em seus lugares” e vai por aí que a lista é longa.

Sobre o racismo ver na Internet o vídeo “as 17 vezes em que Bolsonaro foi Bolsonaro”.

Nesse capítulo, é interessante constatar como o ex-capitão fica próximo em propostas e atitudes do norte coreano Kim Jung Un, comunista que para o ideário bolsonariano é a suprema expressão do mal.

Se Bolsonaro for trocado por Mourão na próxima semana ou daqui a um mês, a agenda conservadora será retomada. Mourão vai substituir os idiotas de Bolsonaro por nomes do PSDB com alguma credibilidade na praça e a bola será tocada pra frente sem maiores problemas.


terça-feira, 14 de maio de 2019

Se Bolsonaro cair já...




Se Jair Bolsonaro cair nas próximas semanas os esforços de setores progressistas, esquerdistas, liberais arrependidos & assemelhados, que planejam o Brasil sem bolsonarismos, será um tanto esvaziado.

Isso porque cairá um presidente que vai sendo visto por grande parte da mídia, políticos à direita, e a maior parte da classe dominante como alguém totalmente incapacitado para ocupar o cargo.

O ex-deputado, que foi eleito com milhões de votos das populações mais pobres com a promessa de exterminar com a bandidagem, sempre teve em mente que bastava extinguir, sindicatos, ONGs, organizações estudantis e correlatos para que o Brasil fosse salvo dos esquerdistas e ingressasse numa gloriosa era de crescimento, com escolas militarizadas, homossexuais “curados” ou banidos, pardos e pretos no seu lugar.

Não deu muito certo. Bolsonaro obviamente não pode fazer nada contra traficantes e milicianos num contexto em que há 13 milhões de desempregados e não sabemos quantos a caminho do mesmo destino.

A presença do exército nas ruas do Rio mostrou a seus eleitores dos subúrbios e periferias que promessas desse naipe também não podem ser cumpridas, com simples entrega de armas a setores de classe média que vivem sob ameaça da bandidagem.

Bolsonaro não tem a menor ideia de que grande parte dos homicídios (que nunca aparecem nos jornais e TVs) acontece entre pessoas que se conhecem, em brigas de trânsito, no botequim, envolvendo vizinhos, marido e mulher & correlatos. Distribuir armas é potencializar o problema.

No embalo dos cem dias, o ex-capitão parece querer descartar-se rapidamente do que seriam suas bases de poder. É possível que, permitindo ataques a oficiais do exército com liderança entre seus pares, o presidente esteja simplesmente externando mágoas antigas do tempo em que foi devidamente defenestrado dos quartéis, após uma tentativa de envolver o exercito em ações terroristas.

Bolsonaro também está fritando o principal responsável por sua eleição. O juiz Moro, que se encarregou formalmente, de impedir que Luiz Inácio Lula da Silva fosse candidato em 2018, vai sendo posto de lado rapidamente, sem que até agora os analistas de plantão saibam exatamente por quê. Alguns desses analistas de plantão acham que Moro tem pretensões à presidência, mas é pouco provável.

Se o governo do ex-capitão caminhar celeremente para o brejo, como indicam as derrotas já ocorridas e prenunciadas, (vem aí a derrubada do decreto das armas) teremos em sucessão: 1) o reconhecimento dos filhos do presidente (e dele próprio) como participes dos grupos de milicianos que assolam a periferia do Rio de Janeiro; 2) tornados réus, o próprio Bolsonaro acabará sendo indiciado e rapidamente removido do poder; com amplo apoio das Forças Armadas e da classe dominante. O general Mourão toma posse.

É bom não sentir muito alívio. Mourão, que tem produzido um discurso civilizado para agradar setores políticos como o PSDB, não muda a orientação em política econômica. Deve apenas mandar ministros com pouca instrução para casa e, quem sabe, outros para o manicômio.

Com Mourão no poder, é bom lembrar, será infinitamente mais fácil aprovar no Congresso medidas como a reforma da Previdência e outras do ideário neoliberal.

É bom não esquecer que o vice-presidente é golpista. Já disse claramente que é favorável a tomada do poder pelos militares em caso de ameaça de um retorno “à situação anterior”. Disse também que 13º salário é jabuticaba e que tem pena dos empresários que pensam em investir no Brasil porque pagam muitos impostos, etc, etc.

Mourão terá apoio sólido de grupos militares e está longe de ser idiota.

Uma permanência mais longa de Bolsonaro no poder, ao contrário do que se possa pensar, pode dificultar eventuais tentativas de golpe quando das próximas eleições.

Isso porque à medida que o ex-capitão vai sendo abalado por sua total incapacidade de governar, movimentos de operários, estudantes, ambientalistas, intelectuais, artistas, políticos, periferia e classe média vão se organizando no sentido de virar o jogo.

quarta-feira, 8 de maio de 2019

As lorotas da reforma




Pois é. O IBOPE pesquisou esses dias a reação do respeitável público sobre a reforma da Previdência. Os resultados mostrados no G1, site das Organizações Globo, são digamos... um tanto confusos!

O G1, que defende galhardamente a extinção das aposentadorias, abriu manchete clamando que 59% dos entrevistados concordam com a reforma proposta por Bolsonaro & asseclas, contra 36% dos que não querem saber de mudanças no que diz respeito a seu futuro.

A rapaziada das Organizações Globo pode interpretar os resultados a seu modo, mas a continuidade na leitura da pesquisa mostra que a coisa não é bem assim.

É verdade que o governo - que aposta, como sempre, na

informação truncada - vai plantar suas lorotas sobre a reforma 

em terreno fértil: segundo o IBOPE, só 30% conhecem os 

principais pontos; 31% não conhecem o conteúdo; 23%; nem 

sabem que o governo apresentou a proposta e 10% não sabem 

ou não responderam a pergunta.

Mas é preciso jogar um pouco de luz sobre os dados do IBOPE.

Por exemplo, quando se lê que a maior parte dos entrevistados (72%) se diz favorável ao estabelecimento de uma idade mínima para as aposentadorias e só 23% são contrários é preciso analisar o que é idade mínima desejável para o respeitável público.

Isso porque entre esses 72% de apoiadores, 33% acreditam que a idade mínima para a aposentadoria deve ficar entre 56 (mulheres) e 60 anos (homens). A proposta do governo é fixar essas datas entre 62 anos e 65 anos respectivamente.

Vinte e cinco por cento dos entrevistados vão mais longe: querem que a idade mínima fique entre 51 e 55 anos e 22% acreditam que todo mundo já deve poder ir pra casa aos 51. Ou seja, as pessoas apoiam a reforma desde que possam se aposentar antes de envelhecerem muito.

A chamada classe dominante, banqueiros principalmente, já pode ficar um pouco preocupada com os rumos da mudança nas aposentadorias. Mesmo com a enxurrada de matérias nas TVs que vem por aí, é possível que o respeitável publico conclua sabiamente que está sendo enganado.








quinta-feira, 2 de maio de 2019

Bolsonaro ainda não subiu no telhado, mas...



Parte da classe média com nível universitário está surpresa com o prometido corte de 30% nas verbas para universidades federais. Não devia. O candidato que apoiou, depois da derrota de Alckmin no primeiro turno, ano passado, é isso aí.

Será que essa classe média, que tem pretensões de ver seus filhos cursando uma faculdade pública, não sabia que educação e cultura nunca entrariam na pauta do atual presidente? Ou podia desconfiar, mas achava que talvez a coisa não fosse tão feia quanto parece agora?

 Num mundo em que cérebros privilegiados são disputados por grandes corporações, universidades e até governos, Bolsonaro e sua rapaziada enxergam inteligência, cultura, formação universitária, como atributos mixurucas de esquerdistas com alta periculosidade.

O capitão, que não faz a menor ideia do que acontece durante um curso de filosofia ou sociologia, tem certeza de que Sócrates, Platão, Aristóteles, Emile Durkheim e C. Wright Mills são meras criações de professores e alunos com viés esquerdista.

Bolsonaro já disse, para câmeras e microfones, que a presidência da república não é exatamente a sua praia, mas infelizmente para o presidente, o país ainda não pode ser transformado num quartel do exército.

Já na campanha, o capitão Jair tinha um plano e dele parece não abrir mão depois de eleito: esmagar todo e qualquer movimento reivindicatório existente no país. De sindicatos a ONGs, passando por Uniões Estudantis, de Sem Terra, Sem Teto, Clubes de Leitura, Grêmios de secundaristas e o que porventura mais exista no gênero. E só. Feito esse trabalho, governança é um item secundário.

Bolsonaro também disse que ia pôr um fim na política do toma lá dá cá, mas na esteira de sua eleição veio à tona o que de pior pode acontecer na política partidária. Deputados e senadores do PSL, chegados ao Congresso através do bolsonarismo, desejosos de colher vantagens em troca de votos no plenário, são um problema duro de superar.

Até mesmo no caso da aprovação da reforma da Previdência. Afinal, deputados e senadores dependem de votos e a reforma não é exatamente popular quanto quer fazer parecer ao respeitável público a Rede Globo de Televisão.

Bolsonaro diz que vai atender às demandas através de emendas constitucionais, mas a turma do “cadê o meu” não parece aprovar a solução.

Que o Brasil compartilha com nações como o Congo, Namíbia, Botsuana, República Centro Africana, Lesoto, Suazilândia e outros menos votados o gosto pela desigualdade, todo mundo sabe. Somos o décimo colocado nesse ranking. O problema é que desigualdade é, ao mesmo tempo, causa e efeito da depressão na economia.

Com o dinheiro cada vez mais concentrado no um por cento da população, não há consumo; sem consumo o comércio fica às moscas, as fábricas fecham suas portas, o desemprego continua crescendo e a economia, como um todo, segue no embalo ladeira abaixo.

É bom lembrar que a reforma trabalhista não criou as vagas no mercado que o governo esperava. Aliás, a precarização do trabalho não surtiu o menor efeito, segundo as recentes pesquisas do IBGE. Então, o aumento da crise é questão de tempo.

É possível imaginar, para dentro de um prazo relativamente curto, o retorno do clima de greves. Primeiro tímidas, depois tomando corpo.

É também provável o retorno das grandes passeatas tipo “Diretas Já”, isolando o governo, intimidando o Congresso e o Judiciário.

Talvez essa iniciativa da classe média possa evitar, mais adiante, a concretização de seu pior pesadelo: a presença nas ruas da população de favelas e periferia, saqueando supermercados, queimando ônibus,  prédios públicos e confrontando a polícia.

(É bom lembrar que alguns eleitores do capitão, nas chamadas comunidades, votaram na promessa de que traficantes, milicianos, ladrões, estelionatários & assemelhados seriam extirpados de suas vidas. E começam a ver que, pelo contrário, a bandidagem continua se fortalecendo).

Nessa altura do campeonato, empresários, rentistas, executivos de multinacionais, banqueiros, a chamada classe dominante, já devem estar conspirando para que o poder mude de mãos.

É provável também que bolsonaristas de ontem comecem a mudar de lado, a rapaziada do PSDB & Centrão inicie uma cruzada por democracia, fora Bolsonaro, e o presidente acabe, como é de praxe, no banco dos réus.

O fascismo no Brasil pode durar dois ou três anos, mas não vai além disso.

terça-feira, 9 de abril de 2019

A teoria furada do crescimento do bolo






Deu no Estadão de sábado:

Na festinha de aniversário da chinesa Alibaba, poucos convidados são do ocidente. A dona da AliExpress chega aos 20 anos hoje empenhada em crescer no varejo do seu próprio país e de nações vizinhas.  Fora desses mercados, os investimentos da gigante de tecnologia são mais pontuais e diversificados: bicicletas, inteligência artificial, carros elétricos e até produção de filmes. (...) Boa parte dos esforços está concentrada em alimentar toda a cadeia do varejo chinês – de serviços de logística a gerenciamento de estoques. A Ant Financial, por exemplo, surgiu como uma forma de ajudar no funcionamento do sistema de pagamentos do país e hoje possui um bilhão de usuários ativos. Já o Taobao, site de vendas feitas exclusivamente para a China, já é o maior e-commerce do mundo (...) E a gigante ainda tem espaço para crescer, já que o varejo da China deve avançar 7,5% este ano, ante os 3,5% nos Estados Unidos, segundo a consultoria eMarketer.

Pois é. No mercado chinês, o protagonista é o consumidor... chinês! Ao contrário do que acontece no Brasil, os governantes chineses têm como prioridade manter aquecido seu mercado interno. Que gira em torno de um bilhão de consumidores.

O mercado se mantém aquecido porque os governantes chineses apostaram na incorporação de massas de trabalhadores rurais, vivendo na linha de pobreza, a um relativamente novo e gigantesco segmento urbano com enorme capacidade de compra/consumo.

Foi o necessário para os avanços da economia chinesa nos últimos tempos, com crescimento em torno de 6, 7.5% ao ano. A Alibaba nem precisa sair pelo mundo à procura de compradores para seu gigantesco portfólio. Trabalhar o mercado interno é suficiente para a empresa chegar a números astronômicos.

Enquanto a preocupação dos chineses é focada na incorporação de novos segmentos da população ao mercado, via aumento de salários, no Brasil a ideia do novo governo é seguir a idosa (e desastrosa) máxima do ex-ministro da Fazenda Antônio Delfim Neto, durante a ditadura. Naqueles tempos, segundo o ministro, “era preciso fazer o bolo crescer para então dividir”,

O bolo, é claro, não cresceu – uma população sem dinheiro não vai às compras, o mercado permanece estagnado, as indústrias trabalham a meia bomba, o comércio tem vendas também restritas, a busca por serviços diminui, o desemprego aumenta e vai por aí, no chamado círculo vicioso.

Embora sem o peso da ditadura, a economia continuou patinando. A queda da inflação durante o governo Itamar Franco até reduziu a pressão sobre os trabalhadores e a economia pareceu, por alguns meses, ganhar fôlego.

Mas a persistência das mesmas práticas acabou com o capital político de Fernando Henrique Cardoso. O PIB brasileiro (quem duvida é só dar uma olhadinha no Google) ficou no vergonhoso 15º lugar, segundo números do FMI, Banco Mundial e ONU.

No governo Lula a situação mudou. Surgiram programas que incentivaram o aumento da capacidade de consumo através do aumento real do salário mínimo, extensão do Bolsa Família, indução ao investimento em programas geradores de mão de obra, como a construção civil, e outras medidas com a mesma finalidade. Pela via do consumo, o PIB brasileiro passou de 15º a 7º (uma outra consulta ao Google  não faz mal a ninguém),

Os governos Dilma Rousseff (em meados do segundo mandato) e Temer retomaram as práticas conservadoras na economia. Bolsonaro, que já está tendo sérios problemas com sua incapacidade de gestão, (ele mesmo disse que nasceu para ser militar e não presidente da república) começa a seguir o caminho da vaquinha rumo ao brejo.

Então, quando o governo fala numa reforma de Previdência para aumentar a capacidade de investimento do Estado é preciso olhar a coisa com muitas reservas.

Em primeiro lugar, o Estado brasileiro está altamente endividado. A massa de dinheiro despendida para rolar essa dívida é que reduz sua capacidade de investimento e não o custo da aposentadoria dos velhinhos. Os juros altos para o pagamento desta dívida faz a alegria do sistema financeiro.

Em segundo lugar, com 13 milhões de desempregados e subempregados não há a mínima possibilidade de recuperação da capacidade de investimentos estatais, via aumento na arrecadação de impostos.

Enquanto procura uma saída para pagar as contas, fazendo com que pobres e classe média cheguem mais tarde aos benefícios da Previdência – o que implica em reduzir o mercado de trabalho para segmentos mais jovens em busca do primeiro emprego – a desigualdade – já identificada por 84% dos brasileiros como a causa de nossos problemas de crescimento, segundo pesquisa publicada nesse fim de semana pela Oxfam - é ignorada e a economia permanece patinando.

O lamentável é com uma população de 240 milhões, a quinta maior do mundo, a classe dominante brasileira não tenha a cultura dos chineses que, desde o século passado sabem que o crescimento da economia só é possível pela via de um mercado interno poderoso e que esse mercado só se faz poderoso pelo aumento da capacidade de compra da população.


terça-feira, 2 de abril de 2019

Trilobitas




É possível que as coisas comecem a se complicar já para o capitão Jair Bolsonaro. Isso porque em seus arroubos, o presidente eleito pode estar criando sérios problemas para a classe empresarial brasileira, basicamente os que têm seus negócios dependentes do mercado externo.

A tentativa de trocar a Organização Mundial do Comércio, OMC, pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos, OCDE, a convite do presidente americano Donald Trump, pode adicionar mais problemas na já complicada nova política externa brasileira, afetando o comércio. O Brasil já tem participação na OCDE, como observador, mas esse não é o problema.

O problema é que, na tentativa de bajular os americanos, o governo negligencia sua presença na OMC, fórum normalmente utilizado para resolver pendengas no mercado internacional, onde é possível “falar de igual para igual" com outros participantes. (Já aconteceu e o país teve suas reclamações atendidas).

A OCDE é um clube de ricos onde a posição brasileira é (e será) de nenhuma importância. Se não fosse assim, o país já seria sócio-atleta da organização faz tempo.

Hoje pela manhã em entrevista à Globonews, os empresários manifestaram sua preocupação com os delírios do governo, nesse capítulo.

Na obsessão de demonstrar uma postura serviçal ao governo norte-americano, Bolsonaro vai enveredando por um viés ideológico, característico dos tempos de Guerra Fria, jogando na lata do lixo uma postura de neutralidade que caracterizava as posições do Brasil nos últimos 40 anos.

O presidente e seu séquito de seguidores com cérebro de trilobita não têm a menor ideia do que pode representar a ameaça de levar para Jerusalém a embaixada do Brasil em Israel. O comércio do Brasil com o país de Bibi Nethanyaho gira em torno de US$ 321 mil. Com os árabes a coisa toda vai a US$ 8 bilhões, principalmente carnes tratadas especialmente para consumo dos seguidores do Islã.

A brincadeira pode afetar uma parte do agronegócio que, como um todo, jogou suas fichas na eleição de Bolsonaro no segundo turno. (No primeiro, os ruralistas apostavam no candidato do PSDB).

Bolsonaro ainda não sabe, mas não tem cacife para enfrentar os interesses de banqueiros, rentistas, industriais e multinacionais. Se sair da linha terá o mesmo destino de Dilma Rousseff, seja lá qual for o pretexto para sua derrubada.

O presidente, é bom lembrar, está voltando às pressas de Israel, reduzindo em um dia sua visita ao país do muro das lamentações.

Na semana passada, o vice-presidente general Hamilton Mourão teve um encontro com 500 empresários. Mourão, que sonha diuturnamente com o palácio do Planalto, é a garantia de uma transferência de poder sem as turbulências que tanto assustam o mercado. Pelo contrário, um governo à direita, mas sem trilobitas no ministério e a volta de uma postura de neutralidade povoam os sonhos da classe dominante.

Por outro lado, esse pessoal pode ter esperanças de conseguir já uma reforma da Previdência mais a seu gosto, sem as encrencas previsíveis que se avizinham, graças ao total desinteresse do presidente em lidar com questões que não incluam o combate permanente às pautas que ele e seus trilobitas consideram esquerdizantes.

Mas é bom não inflar as esperanças. Saem os trilobitas, mas não mudam os rumos. 

PS. Saiu na Globonews agora: O Brasil caiu em 2018 da 26ª posição para o 27º lugar entre os maiores exportadores do mundo, segundo relatório anual divulgado nesta terça-feira (2) pela Organização Mundial do Comércio (OMC).   

Segundo a Wikipédia...  

...os trilobitas (português brasileiro) ou trilobites (português europeu) são artrópodes característicos do Paleozoico, conhecidos apenas do registro fóssil. O grupo, classificado na classe Trilobita da subclasse Trilobitomorpha, é exclusivo de ambientes marinhos. Os trilobitas possuíam um exoesqueleto de natureza quitinosa que, na zona dorsal, era impregnado de carbonato de cálcio, o que lhes permitiu deixar abundantes fósseis. Seu nome (trilobita) é devido à presença de três lobos que podem ser visualizados (na maior parte dos casos) em sua região dorsal (um central e dois laterais).



No seu começo, em 1947, a OCDE denominava-se Organização para a Cooperação Econômica (OECE) e era composta apenas por países europeus. Foi criada com a finalidade de executar o Plano Marshall, um plano financeiro concebido pelos Estados Unidos, para a reconstrução dos países da Europa devastados após a Segunda Guerra Mundial. Em 1960 os EUA e Canadá mostraram interesse em fazer parte da organização. Com a entrada em vigor de uma nova convenção assinada pelos países associados, em 30 de Setembro de 1961 nasceu oficialmente a OCDE.

segunda-feira, 25 de março de 2019

Bolsonaro já subiu no telhado?


  

Do Brasil 247, matéria de Florestan Fernandes:

“Na próxima semana, (esta semana) a Fiesp reunirá em torno do vice-presidente, general Hamilton Mourão, 500 empresários que querem soluções rápidas para a crise de governabilidade instalada no Planalto. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, afirma em entrevista ao Estadão que o governo Bolsonaro é um deserto de ideias”.

Pois é. A possível queda do capitão pode já estar em andamento.

Talvez os desvarios do presidente eleito tenham produzido efeitos devastadores na expectativa da classe dominante. Banqueiros, agronegócio, rentistas, grandes industriais, executivos de multinacionais, que pretendiam colocar no Planalto alguém de sua inteira confiança, como Geraldo Alckmin, por exemplo, deram com os chamados burros n’água.

Não deu muito certo e quem sonhava com um político domesticado no poder, acabou tendo que se contentar com um projeto canhestro de um candidato que prometia simplesmente exterminar com qualquer coisa que cheirasse a comunismo, socialismo, direitos humanos, ecologia, defesa de terras indígenas e quilombos.

E só. Mas Bolsonaro talvez pudesse ainda ser usado para seus propósitos.

No primeiro momento deu certo. O capitão extinguiu os direitos dos trabalhadores, incluindo aí o próprio ministério do Trabalho. No embalo tenta, com algum sucesso, fazer o mesmo com os sindicatos.

A classe média, que é capaz de vender a alma para parecer que faz parte da classe dominante, aplaudiu entusiasticamente o que poderia ser uma opção pelos ricos.

Moradores de comunidades e afins, por sua vez, acreditaram que o candidato do PSL iria exterminar a bandidagem. Logo ele, vizinho e bem relacionado com um grupo poderoso de milicianos, apologista da posse de armas que, com certeza, vão ser usadas em brigas de vizinhos.

Bolsonaro se elegeu e a classe dominante teve, nos primeiros instantes a impressão que poderia conduzi-lo para seus interesses, mas o capitão mostrou que seus delírios só levam mesmo a riscos de sérios prejuízos.

Os homens do agronegócio, entusiastas da eleição do capitão reformado, já sentiram na pele o custo do engano.

É possível que outros segmentos da classe dominante já tenham compreendido que Bolsonaro não tem a menor noção do que é governar o Brasil.

Essa semana general Santos Cruz, secretário de Governo, bateu de frente com Olavo de Carvalho, guru de Bolsonaro, ex-muçulmano agora católico, autodenominado filósofo, apesar de ter completado apenas o segundo grau. O guru chamou os militares de cagões.

Como a troca de Bolsonaro pelo general Hamilton Mourão não provoca o mínimo chilique nas roletas da Bolsa de Valores e o presidente parece ter muita dificuldade em aprovar a reforma da Previdência, é possível que o encontro do vice-presidente com a rapaziada da FIESP seja o pontapé inicial na derrubada do governo.

PS. Temer é solto por um desembargador que passou sete anos afastado do cargo por estelionato, segundo o Estadão. A Lava Jato vai reagir?



  




quinta-feira, 21 de março de 2019

Comemorações comedidas, por favor




É provável que uma parte da população brasileira aproveite a noite de hoje para comemorar a prisão de Michel Temer e Wellington Moreira Franco. Mas recomenda-se uma comemoração comedida. No momento, quando parte do território brasileiro está sendo doado para a instalação de uma base americana no Maranhão, a euforia não cabe.

Temer e Moreira são figuras menores no processo de desmonte da frágil democracia brasileira, embora o ex-presidente tenha sido o serviçal escolhido para abrir as portas do inferno.

Temer, até pelos ternos brancos de linho que gosta de usar, é o protótipo dos ditadores que vicejavam pela América Central nos anos 50, como Rafael Leônidas Trujjilo, Anastácio Somoza Garcia, entre outros, rapidamente esquecidos na poeira da história. Mas ao contrário dessa rapaziada, que governou com mão de ferro, Michel Temer é apenas um pequeno ladrão.

Moreira Franco, um ex-trotskista, que caminhou para a direita sob a égide da família Amaral Peixoto, foi prefeito de Niterói e posteriormente cometeu uma das mais desastrosas administrações já vivenciadas pelos habitantes do estado do Rio de Janeiro. Foi amigo, um tanto íntimo de seu personal trainer, que acabou morto pela polícia dias depois de ser pego com os pés sobre a mesa do governador.

Moreira, não nos esqueçamos, é sogro de Rodrigo Maia, presidente da Câmara de Deputados, o que acrescenta novos ingredientes ao turbulento caldeirão da política nacional.

O filme de horror protagonizado pela dupla, com participação especial de empresários, ou seja, com a participação especial da elite do poder, teve o roteiro mudado quando Bolsonaro ganhou as eleições de 2018.

Atores principais, coadjuvantes e figurantes com mais de alguns segundos na tela ficaram, de repente, com um sério problema nas mãos. O ocupante do Palácio do Planalto quer muito, é bom que se diga, agradar banqueiros, financistas, executivos de multinacionais, industriais e demais membros da classe dominante, mas sua inteligência não é das mais brilhantes e seu desconhecimento da realidade brasileira é total.

E assim, o final do filme se encaminha para o que normalmente chamamos de tragédia. E não raro grandes tragédias na tela levam de roldão até mesmo personagens que aparecem com destaque nos créditos.

Serviçais da Elite do poder como Temer e Moreira Franco, às vezes, são presos porque se tornam vítimas de desajustes do tipo Lava Jato - programa idealizado inicialmente para afastar Luis Inácio Lula da Silva de um terceiro mandato presidencial - mas que fugiu do controle. Pela simples razão de estar sendo manejada por interesses contraditórios.

A comemoração deve ser comedida porque os custos dos desatinos cometidos por Bolsonaro & asseclas podem conduzir o país para o interior das portas abertas por Michel Temer.

Bolsonaro e a cessão do Cerrado aos EUA




Jair Bolsonaro disse, ainda nos Estados Unidos, que vai ceder uma parte do território maranhense ao governo americano.

Depois de instalada a base militar em Alcântara, nenhum cidadão brasileiro poderá colocar os pés na área. Os americanos já deixaram claro que ninguém, fora seus soldados e cientistas, poderá chegar perto da tecnologia utilizada para o lançamento de foguetes, mísseis e congêneres.

Nada de compartilhamento.

Os brasileiros também não vão ficar sabendo se, a pretexto de usar a base para fins, digamos, pacíficos, os americanos vão fazer de Alcântara um ponto estratégico para facilitar a invasão de qualquer país da região. A bola da vez é a Venezuela com suas imensas jazidas de petróleo.

Os americanos pretendem fazer na Venezuela o que fizeram no Iraque, onde a pretexto de “eliminar armas de destruição em massa”, tomaram posse das imensas reservas de petróleo do país. Na Líbia aconteceu a mesma coisa.

Na Venezuela a derrubada de Nicolás Maduro e sua substituição por alguém da confiança de Washington está na pauta de Donald Trump.

Aliás, é possível que a Venezuela já tivesse o mesmo destino, não fosse a descoberta relativamente recente de imensas jazidas de xisto que minimizaram o problema da redução das reservas locais de Petróleo.

(A maior reserva americana é a formação de Green River que se estende por três estados: Colorado, Wyoming, e Utah ).

Doando uma parte do território brasileiro, Bolsonaro auxilia os planos do presidente dos EUA e ainda sinaliza para incautos tupiniquins que o não alinhamento com “nossos irmãos do norte”, pode ser dissuadido com uma rápida chegada ao Cerrado de tropas capazes de colocar de joelhos, em poucos minutos, todo o aparato dos generais que cercam Bolsonaro.

A cessão de parte do território brasileiro, segundo entendem alguns especialistas, terá que passar pelo Congresso, mas esse é um detalhe.

A força da caneta do capitão-presidente, a cultura da propina e do toma lá dá cá são uma séria ameaça à soberania do Brasil. E é bom lembrar também que capital não tem pátria.

É provável que em breve tenhamos que conviver com uma Guantánamo em pleno cerrado maranhense.

PS: Na conclusão do texto fui avisado pelo computador de que Michel Temer acabou de ser preso. Assunto para hoje à tarde.