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domingo, 16 de junho de 2019

Sobre C. Wright Mills e a classe dominante brasileira




O sociólogo americano C. Wright Mills foi o autor de A Elite do Poder best seller que, na década de 50, balizou atitudes da esquerda americana de então. Os rapazes e moças que nas universidades resistiram à Guerra do Vietnam, anos depois, eram um pouco filhos dessa literatura, que incluía outras vertentes é claro.

Logicamente as mudanças sociais acontecidas entre os anos cinquenta e a segunda década do século 21 são profundas.

De lá para cá houve o encolhimento da Guerra Fria, a sobreposição do setor financeiro sobre o produtivo, o fim das viagens espaciais e o crescimento irreprimível da internet. Mas alguma coisa permanece.

Mills dedicou pelo menos um capítulo a rapaziada que, de cima de um monte de grana, tem poder de decisão sobre a vida da maioria e mostrou como isso se exerce.

Para o sociólogo os muito ricos dos anos 50 não eram os homens e mulheres que frequentavam as páginas da Harper’s Bazaar  e as notas na coluna de fofocas de Louella Parsons. (Uma menção de três ou quatro linhas a endinheirados exibicionistas custava os olhos da cara).

Essa gente dourada que esquiava nos Alpes Suíços, era proprietária de automóveis modelo exclusivo e iates de grande calado, casava-se com astros e estrelas de Hollywood e passava férias na Cote D’Azur, saia por aí mostrando ao mundo como era gostoso o sonho americano. Aos olhos das classe médias eram os donos do mundo.

Mas os verdadeiros senhores do Poder, por trás da intrincada rede de articulações a que normalmente chamamos de Política, estavam muito acima. Tinham mais grana ainda.

A maneira como se formavam as relações que permitiam um grupo de ricaços dirigir os partidos Democrata e Republicano não cabe num texto sobre o Brasil de hoje.

No nosso caso - são outros os tempos e as condições dadas - a Elite do Poder não faz questão de transitar nas sombras e não se incomoda de ver publicados números da Oxfam. A ONG inglesa  , que mostra o Brasil fazendo parte do clube dos mais desiguais do mundo. Outros sócios são: Quênia, África do Sul, Namíbia, Botsuana, República Centro Africana, Zâmbia, Lesoto, Colômbia, e Paraguai.

Mas da mesma maneira que ricos americanos na ponta da tabela, a classe dominante made in Brazil também sabe como pode e deve intervir em momentos, como no atual, em que a economia está caminhando a passos largos para o brejo, pondo em risco o que ela, como classe, acumulou até agora. Ou recebeu por herança.

Os ricaços brasileiros achavam que, quando decidiram o afastamento de Lula das eleições de 2018, estaria pavimentada a volta dos tucanos ao poder. Isso apesar de algumas de suas melhores referências estarem sendo moídas nas páginas das reportagens policiais.

Lula foi afastado do pleito, mas a coisa não deu muito certo. O Deus dos cristãos – segundo palavras do próprio eleito – colocou no poder um seu representante.

Tal proeza divina incluiu por tabela a entronização no ministério de uma senhora que tem audiências com Jesus Cristo, um ministro com capacidade de ler nas entrelinhas de um prato da culinária árabe, e outro que dirige um programa de acusações aos adversários, ensinando a seus “subordinados” como vai julgar o material que estão aparelhando nas salas do chamado Ministério Público.

Isso sem falar em Olavo de Carvalho, o guru do Presidente da República com autoridade para demitir ministros de Estado. Quando seus estudos - sobre a certeza que o planeta Terra é absolutamente plano - podem ser deixados de lado, Carvalho entrega-se ao esporte de dedicar palavrões a militares, seus desafetos, no Planalto.

Fica um pouco difícil investidores aplicarem seus dólares em um país governado por pessoas cuja sanidade mental e o nível de conhecimento para o cargo são, no mínino, discutíveis.

É ainda mais complicado quando tomam conhecimento das sólidas preocupações do presidente: armar a população, criar o peso real, liberar a caça a animais silvestres, retirar radares das estradas, deixar impune motoristas que não carregam crianças na cadeirinha, criticar o Poder Judiciário por ter aprovado legislação que considera homofobia crime e vai por aí que a lista é grande.

E mais: europeus não gostaram nem um pouco das medidas que praticamente extinguiram toda a proteção ao meio ambiente no território brasileiro. Mas, nesse capítulo, Bolsonaro deve voltar atrás rapidinho. Como aconteceu quando do projeto de levar a embaixada brasileira para Jerusalém.

Os europeus depois da China e Estados Unidos são um importante parceiro comercial do Brasil.

É bom lembrar que não é muito difícil colocar em pauta o impeachment de Bolsonaro. Os pretextos sobram: a parceria de um de seus filhos com o crime organizado no Rio, o acordo com Sérgio Moro para inviabilizar a candidatura de Lula e detalhes outros que deverão aparecer no momento certo. Ou já estão aparecendo.

A classe dominante só tem a ganhar trocando Jair Bolsonaro por Hamilton Mourão e trazendo o PSDB de volta ao Executivo. Pode inclusive retomar o projeto de reforma da Previdência.

E é bom lembrar que Mourão vem se oferecendo diuturnamente para assumir com os tucanos.

Então pouco importa se a classe média acredita que o site Recept Brasil é um conluio do PT para desestabilizar Bolsonaro. Os verdadeiros donos da grana pouco se lixam para seus parceiros de segunda classe.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Conteúdo do Intercept vira assombração para Lava Jato




Há um dado interessante a ser considerado no tsunami provocado pelas denúncias do site Intercept Brasil.

Ninguém contestou o conteúdo das conversas entre Moro e Dallagnol. O destaque foi para a forma como foram obtidas.

A grande mídia apontou suas baterias para a ilegalidade na captação dos diálogos, Moro e Dallagnol dizem que não fizeram nada demais e bola pra frente.

Pois é, a bola seria tocada pra frente sem maiores delongas – como foi no caso do telefonema entre Lula e Dilma Rousseff grampeado pela PF – se outros elementos não fossem adicionados ao imbróglio político.

Na opinião desse humilde escrevinhador não há fato jurídico capaz de se sobrepor ao fato social, ao fato político, histórico. Ou seja: as leis mudam de opinião ao sabor dos ventos do poder.

Um exemplo ainda próximo foi à capitulação vergonhosa de ministros do STF logo após o golpe do dia 1º de abril de 1964.

A constituição de 1946 teve o mesmo uso do papel higiênico. (Talvez não, porque tinha sido impressa em papel off set um tanto espesso).

Todo o chamado arcabouço jurídico, incluídas as cláusulas pétreas, seguiu em marcha batida para o esgoto e a rapaziada de plantão no STF passou a aprovar, com louvor, toda a legislação autoritária imposta pelos militares que chegaram ao Planalto. Inclusive a pena de morte, lembram?

Favorecido pelos ventos bolsonaristas, o então juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato deliberaram que o papel onde está impressa a Constituição de 1988 talvez possa ser utilizado para a mesma finalidade.

E é até possível que Moro ganhasse mais alguma condecoração pelo estupro da chamada Carta Magna, mas os tempos são outros.

Os primeiros meses de seu parceiro (e Criatura, porque não) à frente do Executivo estão sendo desastrosos e as imbecilidades explicitadas no dia a dia do Planalto – logo removidas pela ação de deputados e senadores – deixam a classe dominante de cabelo em pé, assustada com os rumos que vai tomando o país.

Obviamente banqueiros, grandes proprietários de terras, empresários, executivos de multinacionais desejam ardentemente jogar nos ombros dos segmentos mais pobres da população o peso de uma eventual recuperação da economia. (A aprovação da reforma da Previdência faz parte dessa pauta).  

Mas sabem também que isso não é tudo. A saída, estão carecas de saber, passa pela recuperação do emprego, e do mercado interno.

Ou seja, passa pela redução das desigualdades, tema não muito bem digerido por essa rapaziada.

Quando Bolsonaro pede a empresários que deem “um norte para o governo” (foi num encontro com lideranças da classe ontem em São Paulo) a classe dominante fica ainda mais certa do que já desconfiava: o Brasil é uma caravela que navega alegremente em direção á tempestade.

Infelizmente para Moro, Dallagnol & Cia o conteúdo do Intercept vai continuar assombrando suas vidas.











  

Mais uma do Jair




O presidente Jair Bolsonaro exonerou os onze integrantes do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à tortura, sinalizando que a prática utilizada, geralmente, contra jovens pretos e pobres nas delegacias Brasil afora está digamos... liberada.

Mas atenção: as classes médias bolsonaristas vão precisar ficar mais atentas ao comportamento de seus rebentos. Isso porque a polícia agora vai ampliar o leque dos que “podem” ser... digamos "tratados sem maiores deferências". Incluindo aí a garotada petulante que costuma desafiar os homens da lei, lembrando que são filhos de gente bem postada nas hierarquias da república, que a família tem dinheiro, etc, etc.

Mudando de assunto, pessoas já falecidas da minha família, família conservadora é bom que se diga, atribuíam a Washington Luis (1896/1957) a frase: “governar é abrir estradas.” Não tenho certeza de que o candidato eleito à presidência da República em 1926 e derrubado pela Revolução de 30 seja realmente o autor da afirmação, mas vou me servir dela para tentar jogar uma luz sobre a situação atual.

Para o capitão Jair, “governar é deletar o PT”. Faz sentido, porque enquanto o país afunda numa recessão que vai durar alguns anos, ao invés de tentar buscar soluções, o presidente se mostra muito preocupado com remoção de radares nas estradas, extinção de sanções a motoristas que conduzem crianças sem uso da cadeirinha e a motociclistas sem capacete, fim da legislação contra desmatadores, apoio a liberação da caça, corte nas verbas para universidades e dezenas de outras medidas atribuídas à lavra dos petistas.

Que o capitão não tem a mínima condição de gerenciar o país, todos já estamos cansados de saber. Ele mesmo já disse que gostaria de seguir a carreira militar mas, infelizmente, foi impedido depois que apresentou um plano terrorista para intimidar esquerdistas & afins. Seus superiores não gostaram muito e, gentilmente, defenestraram Jair que... virou deputado.

A série de imbecilidades protagonizadas nos seus pouco mais de 100 dias de governo, a qualidade de seus auxiliares diretos - Moro, seus “conjes”, e sua promiscuidade com Procuradores da Lava Jato, Weintraub, o gourmet capaz de ler nas entrelinhas de uma Kafta e a senhora Damares e suas audiências com Jesus Cristo - sugerem que o governo está à deriva e dificilmente conseguirá emplacar a pauta de Paulo Guedes.

Mas é bom lembrar aos oposicionistas de todos os matizes: não saiam por aí comemorando. Sai Jair Bolsonaro, entram Hamilton Mourão e a rapaziada do PSDB. Sai um imbecil, entra um militar conservador, capaz de continuar a conduzir, sem sustos, a pauta da classe dominante.


terça-feira, 11 de junho de 2019

Por que só agora?




A pergunta é: por que toda a farsa montada pela dupla Moro/Dallagnol só agora veio a público?

(É claro que só mesmo os desconectados com a realidade e fascistas de carteirinha acreditavam que o impeachment de Dilma Rousseff, e a cassação da candidatura de Luis Inácio Lula da Silva não fossem um movimento político).

Mas por que só agora a farsa começa a ser desmontada? É simples. A destruição do PT, um dos objetivos da classe dominante não deu o resultado esperado.

Ao invés de aumentar a popularidade já combalida dos conservadores do PSDB, a farsa fez vencedor das eleições de 2018 um candidato, que prometia, através de uma postura tendente a ditatorial, acabar com as mazelas da recessão que acomete o país nesse momento.

Deu certo para segmentos com menor possibilidade de digerir informações. Acossados pelo aumento da violência setores da baixa classe média e moradores de comunidades apoiaram a solução de mais violência contra o banditismo.  

A classe dominante não perdeu tempo. Depois do frustrante 1º turno passou a apoiar, sem tergiversações o candidato da direita radical, esperançosa de que os custos de uma eventual recuperação da economia fossem lançados nos ombros dos pobres e da pequena classe média.

A verdade é que a classe dominante e grupos de direita nascidos da recessão não tem a menor ideia de como tirar o Brasil do atoleiro. Embarcaram na reforma da Previdência - um presentão oferecido aos banqueiros - porque não viam alternativa a vista.

(A bem da verdade desconfiam que a saída para a crise passe pela redução das desigualdades, com o consequente crescimento do mercado interno. Mas como herdeiros diretos dos “Homens de Grossa Aventura” que aqui chegaram com D. João VI, tem dificuldades com pautas inteligentes).   

Não há a menor possibilidade de uma reforma da Previdência tirar o Brasil do atoleiro. Não há qualquer conexão entre uma coisa e outra.

Como propaganda a reforma é parecida com a salvação do país proposta por Collor de Melo nos anos 90, com sua campanha de “caça aos marajás”.

Como Collor que confiou em Zélia Cardoso de Mello, - uma personagem surgida na campanha presidencial e que, na falta de alguém com um mínimo de competência, acabou ministra da Fazenda - Jair Bolsonaro agarrou-se a figura de Paulo Guedes, uma Zélia de calças compridas, também desconhecido do respeitável público.

Passados pouco mais de cem dias a classe dominante começou a ver que as coisas não eram como pensavam ao apoiar Bolsonaro. Logo logo começou a ficar claro que o presidente eleito não tinha um mínimo de capacidade para gerir uma economia grande e complexa como a brasileira.

Governar para Bolsonaro é, única e exclusivamente, deletar tudo o que o PT fez em seus mais de 12 anos à frente do Executivo. E só. O capitão Jair, aliás, sabe que é perfeitamente incapaz de gerenciar o Brasil. Já disse isso mais de uma vez, lembrando que foi Deus que o colocou na cadeira presidencial e que seu desejo real era ser militar etc, etc.

O problema é que a série de imbecilidades cometidas até agora estão reduzindo as possibilidades de aprovação da reforma, mesmo desfigurada por deputados e senadores, também eles sabedores das extremas limitações do capitão.

Diante desse quadro e na impossibilidade de conseguir impor a reforma da Previdência, a classe dominante parece não ter outra alternativa senão substituir o presidente pelo vice Hamilton Mourão.

Antes que a derrubada seja feita pelas manifestações de rua.

O primeiro passo foi observar passivamente a divulgação das manobras da dupla Moro/Dallagnol.  Globo, Folha & assemelhados abriram espaço, generoso, para as matérias do site Intercep.

Moro é o principal fiador da aventura bolsonarista e sem ele, que é ainda mais popular que o presidente, as coisas se complicam.

Pode ser um tiro no pé. Porque a queda de Bolsonaro não necessariamente vai colocar na presidência um nome conservador do PSDB.

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