O sociólogo americano C. Wright Mills foi o autor de A Elite do Poder best seller que, na
década de 50, balizou atitudes da esquerda americana de então. Os rapazes e
moças que nas universidades resistiram à Guerra do Vietnam, anos depois, eram
um pouco filhos dessa literatura, que incluía outras vertentes é claro.
Logicamente as mudanças sociais acontecidas entre os anos
cinquenta e a segunda década do século 21 são profundas.
De lá para cá houve o encolhimento da Guerra Fria, a
sobreposição do setor financeiro sobre o produtivo, o fim das viagens espaciais
e o crescimento irreprimível da internet. Mas alguma coisa permanece.
Mills dedicou pelo menos um capítulo a rapaziada que, de
cima de um monte de grana, tem poder de decisão sobre a vida da maioria e
mostrou como isso se exerce.
Para o sociólogo os muito ricos dos anos 50 não eram os
homens e mulheres que frequentavam as páginas da Harper’s Bazaar e as notas na coluna de fofocas de Louella
Parsons. (Uma menção de três ou quatro linhas a endinheirados
exibicionistas custava os olhos da cara).
Essa gente dourada que esquiava nos Alpes Suíços, era proprietária
de automóveis modelo exclusivo e iates de grande calado, casava-se com astros e
estrelas de Hollywood e passava férias na Cote D’Azur, saia por aí mostrando ao
mundo como era gostoso o sonho americano. Aos olhos das classe médias eram os
donos do mundo.
Mas os verdadeiros senhores do Poder, por trás da intrincada
rede de articulações a que normalmente chamamos de Política, estavam muito acima.
Tinham mais grana ainda.
A maneira como se formavam as relações que permitiam um
grupo de ricaços dirigir os partidos Democrata e Republicano não cabe num texto
sobre o Brasil de hoje.
No nosso caso - são outros os tempos e as condições dadas -
a Elite do Poder não faz questão de transitar nas sombras e não se incomoda de ver
publicados números da Oxfam. A ONG inglesa , que mostra o Brasil fazendo parte do
clube dos mais desiguais do mundo. Outros sócios são: Quênia, África do Sul,
Namíbia, Botsuana, República Centro Africana, Zâmbia, Lesoto, Colômbia, e
Paraguai.
Mas da mesma maneira que ricos americanos na ponta da
tabela, a classe dominante made in Brazil também sabe como pode e deve intervir
em momentos, como no atual, em que a economia está caminhando a passos largos
para o brejo, pondo em risco o que ela, como classe, acumulou até agora. Ou
recebeu por herança.
Os ricaços brasileiros achavam que, quando decidiram o
afastamento de Lula das eleições de 2018, estaria pavimentada a volta dos
tucanos ao poder. Isso apesar de algumas de suas melhores referências estarem sendo
moídas nas páginas das reportagens policiais.
Lula foi afastado do pleito, mas a coisa não deu muito
certo. O Deus dos cristãos – segundo palavras do próprio eleito – colocou no
poder um seu representante.
Tal proeza divina incluiu por tabela a entronização no
ministério de uma senhora que tem audiências com Jesus Cristo, um ministro com
capacidade de ler nas entrelinhas de um prato da culinária árabe, e outro que
dirige um programa de acusações aos adversários, ensinando a seus “subordinados”
como vai julgar o material que estão aparelhando nas salas do chamado
Ministério Público.
Isso sem falar em Olavo de Carvalho, o guru do Presidente da República com autoridade para demitir ministros de Estado. Quando seus estudos - sobre a certeza que o planeta Terra é absolutamente plano - podem ser
deixados de lado, Carvalho entrega-se ao esporte de dedicar palavrões a militares,
seus desafetos, no Planalto.
Fica um pouco difícil investidores aplicarem seus dólares em
um país governado por pessoas cuja sanidade mental e o nível de conhecimento
para o cargo são, no mínino, discutíveis.
É ainda mais complicado quando tomam conhecimento das sólidas
preocupações do presidente: armar a população, criar o peso real, liberar a caça a animais silvestres, retirar radares das
estradas, deixar impune motoristas que não carregam crianças na cadeirinha, criticar
o Poder Judiciário por ter aprovado legislação que considera homofobia crime e
vai por aí que a lista é grande.
E mais: europeus não gostaram nem um pouco das medidas que
praticamente extinguiram toda a proteção ao meio ambiente no território brasileiro.
Mas, nesse capítulo, Bolsonaro deve voltar atrás rapidinho. Como aconteceu
quando do projeto de levar a embaixada brasileira para Jerusalém.
Os europeus depois da China e Estados Unidos são um
importante parceiro comercial do Brasil.
É bom lembrar que não é muito difícil colocar em pauta o
impeachment de Bolsonaro. Os pretextos sobram: a parceria de um de seus filhos
com o crime organizado no Rio, o acordo com Sérgio Moro para inviabilizar a
candidatura de Lula e detalhes outros que deverão aparecer no momento certo. Ou
já estão aparecendo.
A classe dominante só tem a ganhar trocando Jair Bolsonaro
por Hamilton Mourão e trazendo o PSDB de volta ao Executivo. Pode inclusive
retomar o projeto de reforma da Previdência.
E é bom lembrar que Mourão vem se oferecendo diuturnamente para
assumir com os tucanos.
Então pouco importa se a classe média acredita que o site
Recept Brasil é um conluio do PT para desestabilizar Bolsonaro. Os verdadeiros
donos da grana pouco se lixam para seus parceiros de segunda classe.