Ex-presidente da OAB, petista diz que Cunha e Moro rasgam a Constituição
Candidato em 2014, Wadih Damous teve quase 38 mil votos e ficou na
suplência, mas saiu do banco de reservas e desembarcou em Brasília para ajudar
na reconstrução do PT
O ano está tão difícil para o PT
que uma articulação do partido, comandada pelo ex-presidente Lula, tirou Wadih
Damous do banco de reservas e lhe garantiu uma vaga na Câmara dos Deputados.
Candidato em 2014, ele teve quase 38 mil votos e ficou na suplência, mas
desembarcou em Brasília para ajudar na reconstrução do partido. Ex-presidente
da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio e da Comissão Estadual da Verdade, o
deputado aponta erros do PT, dispara contra o presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), e o juiz federal Sérgio Moro, responsável pelas investigações
da Operação Lava Jato. Para Wadih, os dois estão rasgando a Constituição.
ODIA: A Câmara dos Deputados aprovou,
na semana passada, a redução da maioridade penal para crimes violentos, menos
de 24 horas depois de um texto semelhante ser rejeitado em plenário. Qual sua
avaliação?
WADIH: Na primeira noite de votação, a
civilização venceu a barbárie. Depois, a barbárie venceu com base no golpe
comandado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A Constituição foi violada
e está sendo suja por ele, que faz manobras e age como se fosse proprietário do
Legislativo.
Está jogando lama na Carta Magna: se
ele perdesse, ele ia colocar várias emendas até ganhar. Mas creio que o Senado
irá corrigir essa monstruosidade. Espero que essa discussão seja feita sobre o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que é uma lei ordinária. A
Constituição deve ser mexida o mínimo possível.
Houve mudança de posição de deputados,
determinante para aprovação do novo texto para reduzir a idade penal. Por quê?
Houve pressão?
Essas pressões não acontecem à luz do
dia. Não ocorreram em público. Não sei se foi num restaurante, no gabinete do
presidente... Hoje, na Câmara, não há a menor possibilidade de vencer qualquer
votação que o Eduardo Cunha não queira.
Para defender-se das acusações de
‘golpista’, Cunha e seus aliados têm dito que interpretações do regimento não
podem ser judicializadas. Esse argumento é plausível?
Quem diz isso ou não sabe o que está
dizendo ou age de má-fé. Não há nada acima da Constituição. O que acontece lá é
a manipulação do regimento. Enquanto a Câmara estiver com esta presidência,
vamos caminhar na mediocridade e tudo o que há de pior vai passar. Estou lá
pela primeira vez, mas tenho certeza de que esta é a pior representação da
história do Legislativo.
Cunha, teoricamente, faz parte do
partido que é a base aliada do governo. E o PT nada conseguiu fazer para evitar
sua presidência. Lançou o Arlindo Chinaglia (SP), mas ele foi derrotado. O
partido, então, não tem culpa na sua própria insatisfação?
Não tenho elementos para avaliar quem
estava certo ou errado. Não estava lá. O PT comete erros. Talvez o partido não
tenha entendido o impacto que seria o Eduardo Cunha ali. Talvez tivesse sido
melhor apoiar outro candidato, de outro partido, para a presidência da Câmara.
Não há nada independente na Casa hoje. A maioria está dominada pelo presidente
Cunha. O que se pode fazer é dialogar com movimentos sociais, recorrer ao
Supremo Tribunal Federal, como fizemos neste caso da maioridade penal. Esse mal
não vai durar para sempre.
Segundo pesquisa Ibope, a presidenta
Dilma Rousseff atingiu apenas 9% de aprovação. Há salvação para o governo?
A oposição é boa para ganhar pesquisa,
mas não ganha eleição. Dilma ainda tem três anos e meio de governo e pode
reverter isso. Agora, não minimizo que esse é o pior quadro já enfrentado desde
que o PT chegou ao governo. É um momento muito grave. A economia vai mal, a
política vai mal, mas há ainda chances de melhorar. Depende da política
econômica, da atitude do governo.
As ‘pedaladas fiscais’, como são
chamadas as maquiagens feitas nas contas públicas de 2014 do governo e
apontadas pelo Tribunal de Contas da União, podem resultar em impeachment?
A oposição procura uma razão para
impeachment desde que acabaram as eleições. As pedaladas foram inventadas pelo
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e ninguém nunca falou disso. O PT
contribui para esta crise no TCU, porque não acabou com a indicação política e
com o apadrinhamento no órgão, por conta de uma suposta base aliada. O PT fez
aliança para governar e hoje é subalterno nela.
No fim de junho, o ex-presidente Lula
disse que, hoje, o PT só se preocupa com cargos. Concorda com a tese?
Isso acontece com todos os partidos
populares que chegam ao governo. O PT percebeu que governar é diferente de ser
oposição, que o buraco é mais embaixo, mas se descaracterizou muito. Não tem
mais o militante que veste a camisa, vai panfletar.
Acabou o orgulho de ser militante do
PT?
O orgulho não foi perdido. Está
adormecido. Quando esse militante viu o risco da derrota em 2014, foi para a
rua. Não sei como recuperar. Agora, é necessário provar para as pessoas que o
ajuste vai melhorar.
Há insatisfação de petistas com o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo? Seu nome é incluído no rol dos que
estariam criticando o ministro por causa dos rumos da Operação Lava Jato, que
investiga o escândalo de corrupção na Petrobras.
Desminto qualquer coisa nesse sentido.
Sou amigo do ministro Cardozo. Em qualquer governo, há insatisfeitos. No PT,
muitos estão insatisfeitos com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por
exemplo. O problema da Lava Jato não é o Ministério da Justiça e sim o juiz
federal Sérgio Moro (responsável pelos processos da Lava Jato em primeira
instância).
O que há de errado?
Tudo. Ele age contra a Constituição e
estabeleceu a prisão preventiva como padrão e não como exceção. Essa Operação
Lava Jato apreendeu arquivos de defesa, coisa que a ditadura militar fez em
apenas um caso. Com todas as arbitrariedades, o juiz Sérgio Moro pode estar
decretando a nulidade de tudo o que construiu. Juiz não é salvador de nada.
Essas prisões preventivas são feitas
com qual objetivo?
Obter delações premiadas, que nada mais
é do que o ‘dedo-duro’. O delator é o mau-caráter. Não existe nenhum
arrependido. E, quando o juiz aceita a delação, aceita-se o mau-caratismo como
prática. Não se sabe se é verdade, mentira, mas só que são pessoas dando
depoimentos para amenizar suas penas. E esses delatores estão há meses presos.
Falam o que se quer ouvir.
São nessas delações que se baseiam as
investigações. Depoimento do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, por
exemplo, serviu como mote para que o Superior Tribunal de Justiça investigasse
o governador Luiz Fernando Pezão e o ex-governador Sérgio Cabral.
Nenhum está preso, pois não estão sobre
a guarda do Sérgio Moro. Que provas esses delatores têm? Eles não as
apresentam. Hoje, o fascismo brasileiro não é feito por baionetas, e sim pelos
órgãos do Estado, do Judiciário. É um Estado de exceção.
A alta popularidade do juiz Sérgio Moro
pode ser comparada àquela obtida pelo ex-presidente do STF Joaquim Barbosa
durante o julgamento do Mensalão?
A Constituição é entrave para esse tipo
de julgador, que acha que pode sair julgando só porque tem apoio popular.
Hitler teve apoio popular. Jesus foi crucificado com apoio popular. As
autoridades tem que combater qualquer ilícito, mas não se pode jogar a lei no
lixo em nome disso. A ministra do STF Rosa Weber disse durante o julgamento do
Mensalão que poderia condenar sem provas. Sabe quem era o assessor penal dela?
O juiz Sérgio
A Operação Lava Jato vai chegar ao
ex-presidente Lula?
Não sei por que chegaria. Ele seria
preso porque incentivou empresas a fazerem negócios no exterior? Então, prendam
o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton também. E todos os presidentes
que tentaram fazer negócios fora de seu país.
O senhor foi colocado na CPI da
Petrobras para tirar o foco do PT?
Participei da segunda sessão na CPI.
Ela não substitui a PF, o Judiciário, o MP. Se quiser trabalhar sério, vai
aperfeiçoar a lei para punir quem vaza delação premiada, por exemplo. Há na CPI
atropelo seletivo da ordem. Tem deputado que ofende o depoente e vai embora.
Envolto em tantas turbulências, é
possível projetar de que forma o partido sairá para disputar as eleições
presidenciais de 2018?
Não sei como fica a conjuntura até lá.
Não vai ser fácil. Já vai ter eleição no ano que vem, e será um termômetro. O
PT está numa situação complicada, é claro que ele vai ter que enfrentar esse
quadro. Hoje, quando se tenta chegar ao Lula de qualquer maneira , fica claro
de que não querem de jeito algum que ele seja candidato. Se ele disser que não
quer ser candidato, vão parar de pegar no pé dele: enfrentá-lo no voto não é
algo que está a altura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e do governador de São
Paulo Geraldo Alckmin (PSDB).
Num cenário melhor que o atual, então,
o partido fecha questão em torno do nome dele.
Fecha. Infelizmente, a única liderança
nacional que o PT tem é o Lula. Deveria aproveitar, aliás, para forjar novas
lideranças agora, pois não existem líderes que surjam em bons momentos, só em
crises. Seria bom que o PT tivesse outras alternativas.
O que se comenta, também, é de uma
possibilidade de composição futura do Lula com o prefeito do Rio Eduardo Paes
(PMDB). Eles são bem próximos.
O ex-presidente tem grande estima pelo
Eduardo Paes. A despeito de qualquer restrição ao Paes, trata-se de uma
liderança. Se o prefeito assumisse determinadas bandeiras, com um governo
hegemonizado pelo PT... Há resistências no partido, mas ainda falta muito tempo
para as eleições.
Para 2016, prevê-se novamente um
desembarque de petistas insatisfeitos com a aliança com o PMDB no Rio na candidatura
do deputado estadual Marcelo Freixo (Psol). De que lado o senhor ficará?
O PT, por mais atormentado que esteja,
precisa pensar em ter uma candidatura própria. Escolher entre o Pedro Paulo
(PMDB) e o Freixo não conta com minha simpatia. Devemos apostar sem prejuízos
em um candidato com as tradições do partido.
LEANDRO
RESENDE, no Jornal O
DIA
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