Henrique Pizzolato: fuga para ser julgado em outra corte |
O Cafezinho tem a honra de publicar, com
exclusividade, uma carta denúncia de Andrea Haas, esposa de Henrique Pizzolato,
hoje preso na Itália, na qual ela expõe, didaticamente, todas as injustiças e
arbitrariedades sofridas por seu marido.
O documento foi escrito hoje mesmo, após contato mantido por email. É a
primeira vez, depois de mais de oito anos de calvário, que Andrea Haas comunica
ao mundo tudo que viu, aprendeu e sofreu com o famigerado “mensalão”.
Ela também explica porque Pizzolato fugiu. Diante da truculência
maldosa de Barbosa contra Dirceu e Genoíno, é possível ter uma ideia do que se
passou pela cabeça de Pizzolato antes de tomar a difícil decisão de procurar
justiça em outro país.
Como Haas e Henrique são muito unidos, é quase uma carta do próprio
Henrique Pizzolato. Trata-se de um documento de alto valor jurídico e político,
porque não há uma palavra fora do lugar, que não seja fundamentada em
documentos e provas constantes na Ação Penal 470.
Peço a todos que leiam este documento com muita atenção, porque não é
apenas a vida de um ser humano que está em jogo. Quer dizer, se fosse apenas a
vida de um ser humano, já seria de importância essencial. Mas a carta é mais
que isso.
É uma denúncia contra uma sequência tão assustadora de arbitrariedades
por parte do Ministério Público e do STF, que não cabem aqui mais falar em
erro. Houve má fé. Houve dolo. Houve crime.
Nem MP nem STF podem agir ao arrepio da lei. Eles não são a lei. A lei
tem de proteger tanto Pizzolato como MP e STF. Ou antes, tem que proteger muito
mais um cidadão comum do que agentes da lei que já gozam de inúmeras blindagens
corporativas.
A carta, porém, também é mais que uma denúncia-crime contra dolos do MP
e do STF. Ela é uma denúncia contra um golpe jurídico-midiático, do qual
Henrique Pizzolato foi um bode expiatório, ficando numa posição central.
A denúncia contra Pizzolato talvez seja a mais kafkiana e absurda de
todas, e, no entanto, é ali que reside o pilar central da farsa. A acusação de
quadrilha caiu e o mensalão ficou em pé. Se cair a farsa do desvio da Visanet,
a farsa se desmancha.
Por isso o MP está desesperado para que Pizzolato seja extraditado. Há
pânico de que as provas sejam analisadas novamente por uma outra corte.
Se isso acontecer, Pizzolato será fatalmente inocentado, pois não há
provas contra ele. Ao contrário, há documentos inúmeros provando sua inocência.
Leiam a carta com atenção, sem preconceito. É uma carta de uma mulher
ferida, angustiada, mas ainda dotada de uma grande energia, que por sua vez
nasce da indignação infinita de ver o homem que ama, com quem conviveu a vida
inteira, ser condenado injustamente, qual um cordeiro sacrificado, para gerar
lucro político para meia dúzia de nababos da mídia.
Esperemos que as pessoas conscientes do papel da mídia durante todo este
processo chamado mensalão prestem bem atenção no que vão ler, porque é um texto
do qual não se pode sair impune.
Alguma coisa tem de ser feita para se ajudar Pizzolato, porque é o
seu processo que, concretamente, pode derrubar toda a farsa montada para
enganar o Brasil e atrasar os avanços políticos que se fazem necessários para
libertar nosso povo.
*
Entenda porque Pizzolato fugiu
Por Andre Haas, esposa de Henrique Pizzolato
Pizzolato veio para a Itália em busca de refúgio e do direito à justiça
que lhe foram negados em um julgamento político e de exceção feito na Suprema
Corte do Brasil.
A carta pública amplamente divulgada no dia 15/11/2013 já deixou isso
bem claro. Foi condenado sumariamente por um único tribunal, por uma única
decisão.
Não teve direito a nenhum recurso, não teve direito a nenhuma revisão da
sentença que o condenou a 12 anos e sete meses de prisão mais multa por crimes
que não cometeu e que sequer existiram. Foi “selecionado” para justificar a
falsa e grave acusação que dinheiro público foi utilizado por integrantes do PT
e do governo do PT para comprar apoio político em favor do governo do ex
Presidente Lula.
Acusação infundada. Uma grande
mentira, pois o dinheiro dito público, em verdade pertencia à Visa
Internacional. O dinheiro nunca pertenceu ao Banco do Brasil.
O BB Banco de Investimentos S/A era um dos 25 parceiros da Visanet que
tinham obrigações de atingir metas estabelecidas pela Visa Internacional.
No ano de 2000, a Visa América Latina e Caribe determinou que a Visanet
participasse do “Domestic Cooperative Brand Development Fund”, serviço
disponibilizado pela Visa aos membros (participantes que mantinham contrato com
a Visa) com o objetivo de dar suporte ao crescimento da bandeira (marca Visa).
Diante desta determinação, o
Fundo de Incentivo (para marketing) Visanet foi constituído em 2001 no Brasil
e, a ele, foi destinado a porcentagem de 0,1% do faturamento total da Visa no
Brasil.
O dinheiro deste Fundo foi disponibilizado aos bancos parceiros da Visa,
que participavam da Visanet, para ser utilizado em campanhas publicitárias para
promover a marca Visa.
A Visanet editou um Regulamento com todas as regras que deviam ser
obedecidas pelos bancos parceiros que optassem por utilizar o dinheiro do
Fundo.
Este Regulamento definia que instâncias diretivas próprias da Visanet
tinham exclusivo poder para decidir tudo o que se referia ao dinheiro do Fundo
Visanet.
Desde o ano de 2001, a Visanet sempre pagou diretamente e em forma de
adiantamentos para as agências de publicidade do Banco do Brasil, para que
confeccionassem propagandas da marca Visa e confirmou que estas propagandas
foram efetivamente realizadas.
As provas e documentos que atestam estas afirmações estão no processo e
comprovam que o dinheiro não era público e eram outros os funcionários do Banco
do Brasil e, não Pizzolato, que tinham responsabilidade para gerir e solicitar
que a Visanet efetuasse pagamentos à DNA Propaganda.
Pizzolato foi condenado por receber dinheiro, porque “liberou” dinheiro
da Visanet para a agência de publicidade DNA Propaganda.
Pizzolato nunca “liberou” dinheiro para a DNA. Isto era impossível.
Somente o gestor, funcionário do BB da diretoria de varejo tinha este poder e
de fato, todos os documentos encaminhados à Visanet, inclusive as solicitações
de pagamento, foram assinados por funcionários da diretoria de varejo.
Pizzolato foi acusado por “favorecer” a DNA ao prorrogar o contrato de
publicidade. A prorrogação do contrato foi decidida em documento assinado pelo
conselho diretor do BB (presidente e sete vice-presidentes) antes de Pizzolato
assumir o cargo de diretor de marketing.
O dinheiro dito recebido por Pizzolato, foi para o Diretório do PT do
Rio de Janeiro, como constam em depoimentos que estão no processo.
Muitos documentos foram desconsiderados por ministros do STF e ocultados
das defesas dos réus da Ação Penal 470. Dentre eles, cito o Laudo 2828/2006
feito pela Polícia Federal que lista 15 dos maiores recebedores do dinheiro
pago pela Visanet desde o ano de 2001, entre eles a Tv Globo e Casa Tom Brasil.
Se o Laudo 2828 confirma que muitas empresas foram pagas com o dinheiro
da Visanet, como os acusadores podem afirmar que o mesmo dinheiro foi desviado
para favorecer o PT?
Se estas empresas receberam dinheiro da Visanet, como afirma o laudo,
pela lógica, a investigação deveria ter sido feita para comprovar se estas
empresas realizaram efetivamente os serviços ou se desviaram o dinheiro para o
“esquema” denunciado pelo ministério público.
O Laudo 2828 é emblemático para comprovar os absurdos cometidos neste
julgamento, embora existam muitos outros.
Foi feito pela polícia federal para investigar, contabilmente, a relação
entre a Visanet e a DNA Propaganda. Documentos da Visanet e da DNA foram
confiscados mediante mandado de busca e apreensão.
Este laudo apesar de ter sido feito na fase de investigação, portanto,
sem qualquer acompanhamento das defesas, responde quem eram os responsáveis,
desde 2001, perante a Visanet e perante o Banco do Brasil para gerir o dinheiro
do Fundo Visanet.
Nomina quais foram as empresas, ditas “os maiores recebedores” do
dinheiro destinado pelo Fundo Visanet. Pizzolato sequer é citado no laudo, pois
nos documentos apreendidos não existe nenhum assinado por ele.
Todos os documentos enviados pelo Banco do Brasil à Visanet foram
encaminhados e assinados por outros funcionários de outra diretoria.
O Laudo 2828/2006 foi feito “no interesse do inquérito 2245” como dizem
os peritos no primeiro parágrafo, mas nunca constou do inquérito 2245 que
investigava o chamado “escândalo do mensalão”.
Este laudo apesar de já estar concluído em 20 de dezembro de 2006 – 8
meses antes do julgamento para aceitação da denúncia que ocorreu em agosto de
2007 – nunca fez parte do inquérito 2245, portanto os advogados não tiveram
acesso a ele para preparar suas defesas.
O laudo foi para outro inquérito de número 2474, também no STF, mas
mantido em segredo de justiça pelo mesmo relator do inquérito 2245.
A existência do Inquérito 2474 nunca foi informada aos advogados de
defesa dos “40” réus da AP 470. O 2474 foi aberto para separar documentos de
investigações que não haviam sido concluídas(!).
Ora, 40 pessoas foram “eleitas” para serem denunciadas sem que as
investigações tivessem sido concluídas?
E, pior, quando o inquérito 2474 foi descoberto, o acesso aos documentos
foi negado aos advogados sob o argumento “… os dados constantes do presente
inquérito (2474) não serão utilizados na análise dos fatos objeto da AP 470,
por tratarem de fatos diversos, não havendo, portanto, qualquer cerceamento do
direito de defesa…).
Como dizer que não houve cerceamento de defesa se um documento, um
Laudo, que dizia respeito a todos os acusados foi ocultado de suas defesas?
Pizzolato foi acusado criminalmente por “não fiscalizar” o contrato de
publicidade entre o BB e a DNA no que se refere aos “bônus de volume”, valor
pago por veículos de divulgação para fidelizar (premiar) agências de
publicidade e que, no entender dos acusadores, deveria ter sido devolvido ao
Banco do Brasil.
Como depôs um alto executivo da Globo, não foi Pizzolato quem criou o
“bônus de volume”. Não era responsabilidade dele fiscalizar os contratos do
Banco do Brasil com as agências de publicidade.
Esta atribuição era de outro funcionário do BB e a conferência de
pagamentos e notas fiscais era feita por outra diretoria.
O Banco do Brasil nunca cobrou a devolução de “bônus de volume” de
nenhuma das tantas agências de publicidade contratadas.
Tal parcela nunca constou em cláusula de contrato e nem poderia constar,
por se tratar de uma oferta facultativa (comissão, prêmio) oferecida às
agências de publicidade por parte de empresas prestadoras de serviço, depois
que as negociações, em que participavam os funcionários representantes de
empresas públicas, já estavam concluídas.
Por que Pizzolato foi responsabilizado criminalmente se a permissão para
o pagamento de “bônus de volume” consta em lei
(http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12232.htm ) e
continua sendo uma relação exclusivamente privada entre as agências de
publicidade e fornecedores, da qual nenhum contratante (empresas públicas)
participam?
O julgamento da AP 470 foi injusto para todos. Para uns, provas e
documentos foram desconsiderados, indícios prevaleceram sobre as provas, para
outros, teorias “jurídicas” justificaram a falta de provas. Leis
constitucionais e convenções internacionais foram desrespeitadas, o direito à
defesa foi negado.
Pergunto: por quê?
Que interesses estão acima e são mais importantes para que o direito de
defender a liberdade seja negado?
Para Pizzolato não existiu nenhum direito de recurso e revisão da
decisão do julgamento.
Permanecer no Brasil significava sujeitar-se à uma única decisão, tomada
por um único tribunal.
Significava sujeitar-se à prisão, à injustiça sem ter mais como e a quem
recorrer.
Apesar da enorme tristeza e decepção com a forma como transcorreu o
julgamento, enfrentamos com as forças que nos restaram de anos de agonia e
lutamos com os meios que estavam ao nosso alcance para informar e denunciar os
erros e irregularidades do julgamento, para divulgar as provas e documentos,
que foram desconsiderados e ocultados, e que comprovam que não existiu desvio
de dinheiro, muito menos de dinheiro público.
Uma luta desigual diante do poder do Estado, diante do poder judiciário,
que julgou e condenou desrespeitando leis e direitos fundamentais, e que
continua massacrando e oprimindo pessoas que foram julgadas e condenadas em um
julgamento injusto.
A decisão de vir para a Itália foi difícil e dolorida, pois significou o
descrédito. Viemos buscando sobreviver à opressão, não queríamos nos render à
injustiça.
Estamos nas mãos de outro Estado. Dependentes de uma decisão que o
Estado italiano tomará a respeito do pedido de extradição feito pelo Procurador
Geral do Brasil.
Não tenho mais certezas de nada. Gostaria de acreditar que justiça ainda
possa existir em algum lugar e que uma decisão daqui pudesse reverter todas as
injustiças que foram feitas no Brasil. Gostaria de acreditar que um novo
julgamento possa ser feito e que este seja justo.
Mas confesso, temo pelas decisões que são tomadas politicamente que
desprezam princípios e direitos e que desconsideram fatos e provas.
Andrea Haas
Postado por Miguel do Rosário em 02/05/2014
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