Castelo Branco acabou detonado por outro grupo de militares |
O jornal Folha de S. Paulo publica, na
coluna de Ricardo Melo, um documento histórico. Um telegrama de 14 de agosto de
1965 enviado pelo então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln Gordon, para o
Departamento de Estado, relatando uma conversa com o dono das Organizações
Globo, Roberto Marinho.
"Para:
Departamento de Estado 14 de agosto de 1965
Confidencial.
Este
é um relato de um encontro extremamente confidencial com Roberto Marinho,
publisher do ‘Globo’, sobre os problemas da sucessão presidencial. A proteção da fonte é essencial.
Marinho
estava convencido de que a manutenção de Castello Branco como presidente é
indispensável para a continuidade das políticas governamentais presentes e para
evitar uma crise política desastrosa.
Ele
tem trabalhado silenciosamente com um grupo incluindo o general Ernesto Geisel,
chefe da Casa Militar, general Golbery, chefe do Serviço de Informações, Luiz
Vianna, chefe da Casa Civil, Paulo Sarazate, uns dos amigos mais íntimos do
presidente.
No
início de julho, Marinho teve um almoço privado com o presidente. Marinho achou
Castello bastante resistente a qualquer forma de continuidade de mandato ou sua
reeleição.
Marinho
também pediu a volta do embaixador Juracy Magalhães para ser o ministro da
Justiça.
Objetivo:
ter Juracy como um possível candidato a sucessor de Castello e melhorar o funcionamento
daquele ministério, cujo ocupante, Milton Campos, é extremamente respeitável,
mas dócil demais.
No
dia 31 de julho, Marinho teve um segundo almoço reservado com o presidente no
qual ele insistiu que eleições presidenciais diretas em 1966 sem ter Castello
como candidato poderia trazer sérios riscos de retrocessos.
Tudo
bem pensar em Juracy Magalhães ou Bilac Pinto como sucessores, mas a eleição
deles não estava garantida.
E a
indicação, pelo PTB, do marechal Lott com uma plataforma abertamente antirrevolucionária
e com o apoio dos comunistas ilustrava os perigos.
Marinho
falou ao presidente que entendia o desejo de Castello de manter a promessa de
deixar o poder no começo de 1967, mas se isso fosse feito ao custo de uma volta
do Brasil ao passado, Castello estaria violando a confiança que a nação tinha
depositado nele.
Para
Marinho, Castello deveria pesar as alternativas e riscos cuidadosamente.
Embora
Castello não tivesse indicado explicitamente, Marinho saiu satisfeito no final
da conversa. Achou que o presidente não se oporia e mesmo daria sua colaboração
a medidas que permitissem sua reeleição, provavelmente na forma de eleição
indireta.
Nestas
bases, o grupo planejou uma estratégia para transformar a eleição presidencial
de 1966 em eleição indireta e viabilizar a candidatura de Castello Branco.
Os
próximos passos eram ganhar alguns membros chaves do Congresso tais como Pedro
Aleixo, Bilac Pinto, Filinto Muller e líderes do PSD.
Marinho
enfatizou que muitos obstáculos inesperados poderiam surgir nesta estratégia,
que com certeza terá a oposição de Lacerda por um lado e de forças
antirrevolucionárias por outro lado.
Comentário.
As colunas de fofoca política estão cheias de especulações sobre mudanças no
regime. Eu considero as informações de Marinho muito mais confiáveis.
Lincoln
Gordon.”
Juntamente com este
relato, cabe uma observação:
O presidente
Castelo Branco, chefe do Golpe de Estado de 1964, tinha um forte laço familiar
com Walter Moreira Salles. Sua mulher era tia-avó da mulher de Moreira Salles.
A verdadeira razão talvez do truculento Golpe de Estado não tenha nada a ver
com o comunismo.
Tem sim razões
fundamentalmente econômicas, como sempre.
A exportação de
café no Brasil representava 60% da balança comercial. Naquele momento, o
Instituto Brasileiro de Café (IBC) era dirigido por um grupo nacionalista. O Brasil
enfrentava a industrialização do café subsidiando a indústria do café solúvel.
Paralelamente,
havia supostas mortes e sequestros de jovens que seriam ligados a movimentos
estudantis no campo, ligados às Ligas Camponesas.
O nomeado
presidente do IBC não era outro senão o sócio do grupo de Walter Moreira
Salles, sr. Julio Avelar.
Pressionado pelos
militares nacionalistas, Castelo Branco pediu a Roberto Campos que substituísse
Julio Avelar. Roberto Campos e o grupo dos interesses econômicos nomearam outro,
supostamente independente. Era do Paraná, o que justificada seu conhecimento no
setor do café.
Era funcionário
da Caterpillar, empresa de Walter Moreira Salles.
No Ato
Institucional nº 5, esses mesmos coronéis exigiam a cassação de Moreira Salles
por sua ligação extensa com Juscelino Kubitschek e por ter sido grande
financiador da campanha de Getulio Vargas, o que lhe rendeu ser embaixador em
Washington e o único no mundo a ter concessão de mina de nióbio - um metal raro
no mundo, mas abundante no Brasil, considerado fundamental para a indústria de
alta tecnologia e até no setor nuclear.
Referente a esta
carta que circula hoje na imprensa, a sociedade civil brasileira defendia
Juracy Magalhães para presidente. Ele foi esmagado na convenção para disputar o
apoio da UDN, num movimento comandado por Carlos Lacerda em apoio a Jânio
Quadros.
Juracy ficou
conhecido pela célebre frase: "O que é bom para os Estados Unidos é bom
para o Brasil."
O fato de Carlos
Lacerda ter desapropriado o Parque Lage, na Zona Sul do Rio, serviu também para
aumentar a ira dos militares. Daí começou uma campanha violenta levando-o a ser
cassado supostamente por pertencer à Frente Ampla, com João Goulart e Juscelino
Kubitschek.
Jornal do Brasil em 05/05/2014
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