Para quem está acostumado a analisar fatos da política, a
partir do que acontece na economia, é difícil imaginar que alguns frenéticos movimentos
no tabuleiro de xadrez da política nacional, nos últimos dias, sugiram que a
trajetória de Jair Bolsonaro na presidência da República esteja se aproximando
do fim. Pode até acontecer, mas será surpreendente.
Não é assim que a banda toca. A possibilidade de promover o
desmonte da Previdência Social interessa à classe dominante, para quem Jair
Bolsonaro é um serviçal inesperado. Um serviçal que, se necessário, poderá ser defenestrado
mais adiante. Inesperado porque a classe apostava na eleição de liberais
domesticados como Alckmin & assemelhados.
Mas Bolsonaro venceu a eleição e a partir daí banqueiros,
industriais, grandes proprietários de terra, executivos das multinacionais, passaram
a ter que conviver com o despreparo para o cargo que o capitão reformado expõe
todo dia nas redes sociais. Conviver e aguardar seus canhestros movimentos no
xadrez da política. Se Bolsonaro não adquirir os votos necessários para
suprimir o direito à aposentadoria, aí sim, está fora.
Voltando aos movimentos no tabuleiro de xadrez. O presidente
tem peças adversárias bem próximas de suas defesas. O general Hamilton Mourão,
vice-presidente, continua em sua cruzada para se tornar alternativa segura a assumir
o Planalto. Suas declarações divergindo ou até antagonizando as diatribes do
capitão-presidente agradam a setores liberais e até a uma parcela da esquerda e
de movimentos sociais que se vêem seriamente ameaçados pela retórica ultradireitista,
homofóbica e racista do presidente.
É também bastante sintomático que, em um movimento pouco
discreto, as Organizações Globo tenham escalado a colunista Miriam Leitão para
desancar as posições de Bolsonaro, na área da economia. Pode ser um sintoma de
que a classe dominante já começa a ter problemas com o serviçal inesperado.
Fica também muito claro que o capitão-presidente não tem a força que pretendia
quando eleito.
(Nesse capítulo é bom lembrar que um de seus filhos chegou a
ameaçar o fechamento do Supremo Tribunal Federal, bastando para isso “a
presença de um cabo e um soldado”).
O episódio do vídeo pornô que deixou boa parte da classe
média conservadora em estado de choque, pode não ter importância política, mas parte
de seus apoiadores incontestes ficou inesperadamente órfã.
É bem provável que, a partir de agora o capitão não possa
mais exibir a desenvoltura dos pequenos ditadores sul-americanos quando em
atividade e tenha que se contentar em só tomar decisões depois de consultar os
generais que o cercam. Aliás, é possível que os militares do entorno passem a
“aconselhar” mais de perto o Chefe do Executivo. Tuítes aloucados estão, desde
já, proibidos.
O capitão-presidente não deve cair porque a instabilidade
não interessa à classe dominante. Banqueiros,
capitães de indústria e homens do agronegócio, embora temerosos dos próximos movimentos
de Jair Bolsonaro – por exemplo, a transferência da embaixada brasileira para
Jerusalém em detrimento de nossas relações comerciais com o mundo árabe – já receberam
do capitão uma importante bonificação: o ministério do Trabalho desapareceu e
os sindicatos estão a caminho da extinção.
É um ganho significativo para ser desperdiçado por episódios
protagonizados por um presidente, que esses mesmos empresários reputam como um
idiota perfeitamente controlável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário