“O governo brasileiro acredita que é possível encontrar
uma solução para devolver a Venezuela ao convívio democrático das Américas, sem qualquer medida extrema que nos
confunda com aquelas nações que serão julgadas pela história como agressoras,
invasoras e violadoras das soberanias nacionais”. O discurso, segunda-feira
(25) na Colômbia, é do vice-presidente da República Federativa do Brasil, Hamilton
Mourão.
Está tudo muito bom, está tudo muito bem, mas realmente...
realmente faltou acrescentar: o país vai se posicionar contra o cerco
econômico imposto ao governo de Caracas e Maduro é problema dos
venezuelanos.
A fala do vice deve ter provocado um profundo desgosto no
chanceler brasileiro Ernesto Araújo, que, aliás, estava a seu lado. Araújo manteve diante da mídia a correta postura do cão de companhia e só abriu a boca quando
o general mandou.
Ou seja, a política externa do Brasil não tem nada a ver
com ele – e nem com Bolsonaro – é prerrogativa dos generais no Planalto e ponto
final.
Um parêntesis: esse detalhe pode ser indicativo de que Araújo
e a ministra da Mulher, Direitos Humanos, etc, etc, Damares das quantas, não são
levados a sério pela tropa que chegou ao poder com Jair Bolsonaro. Damares,
aquela senhora que vê Jesus caindo da goiabeira, e Ernesto Araújo foram indicados para
os cargos pelo filósofo, com segundo grau completo, ex-muçulmano, praticante da
poligamia e agora católico fervoroso e anticomunista de carteirinha, Olavo de
Carvalho. Fecha parêntesis.
Talvez o próprio Bolsonaro já não tenha tanta importância
assim no quartel do Planalto, obrigado a engolir de volta e rapidamente palavras
ditas anteontem e outras alguns dias antes.
Como, por exemplo, a afirmação de que ‘a China é um
predador que quer comprar o Brasil’ ou a proposta de transferência da embaixada
do país de Tel Aviv para Jerusalém.
Mourão vai à China cuidar de minimizar as bobagens ditas pelo presidente e os israelenses terão de se dobrar aos interesses do agronegócio brasileiro.
O ex-capitão disse também, meses atrás, aos jornalistas
que cobrem a Câmara dos Deputados, que a reforma da Previdência proposta por Temer era absurda! Foi mandado inverter os sinais e, as pressas, apresentou outra,
um pouco mais radical ainda.
Mas voltando ao general Mourão. Antes que sites e blogs
progressistas se animem com a figura é bom ler o que saiu na revista Carta
Capital:
“Nos últimos anos, Mourão passou a adotar um perfil linha dura
semelhante ao de Bolsonaro. Em seu último discurso como general no Salão de
Honras do Comando Militar do Exército, no fim do ano passado, chamou o
torturador Carlos Brilhante Ustra de 'herói’. *
Antes de deixar o cargo de secretário de Economia e Finanças do
Comando do Exército e seguir para a reserva, Mourão causou enorme polêmica ao
defender, em uma palestra
promovida pela maçonaria em Brasília em 2017, uma possível intervenção das
Forças Armadas caso as instituições não resolvessem “o problema político.”
À época, o militar
afirmou que ou o Judiciário retirava da vida pública “esses elementos
envolvidos em todos os ilícitos” ou o Exército teria de “impor isso”. Ele
afirmou que não existe uma fórmula de bolo para uma revolução ou uma
intervenção, mas que haveria “planejamentos muito bem feitos”.
Muitos cobraram à época uma punição para o general, mas Villas Boas Corrêa, comandante do Exército,
preferiu resolver o caso internamente e acelerar a aposentadoria de
Mourão.
Em 2015, o comandante do
Exército também resolveu internamente outra polêmica. Exonerou Mourão do
Comando Militar do Sul e o transferiu para a secretaria de Finanças após seu
subordinado criticar abertamente o governo de Dilma Rousseff.
Virando essa página e já
como vice-presidente da república, o general mudou completamente o tom, segundo
a revista Exame:
“Ao
contrário do que disseram os integrantes do clã Bolsonaro, por exemplo, Mourão
disse considerar graves as ameaças contra o ex-deputado Jean Wyllys, afirmou
que é a mulher que deve tomar a decisão em caso de aborto, defendeu
investigação sobre as suspeitas que pairam sobre o senador Flávio Bolsonaro e –
“traição” suprema a quem costurava acordos com Israel e Estados Unidos –
recebeu uma delegação palestina e se opôs ao alinhamento automático com
qualquer país".
Um final perfeitamente
alinhado com o recente discurso na Colômbia.
Mourão também disse - e aí o copyright
é meu “que proibir a ida de Lula ao funeral do irmão era uma desumanidade”.
O general é, por enquanto, um enigma. Sabemos, pelos antecedentes, que despreza o capitão-presidente e que está disposto a dizer o que pensam os militares no quartel do Planalto.
Mas é só isso mesmo ou explicitando um contraste entre ele e os
bolsonaristas, o vice pretende se apresentar como alternativa muito mais viável aos interesses dos militares !?
De qualquer modo, nos últimos dias, a rapaziada de Curitiba e
grupos ávidos por um lugar ao sol entre os que almejam se tornar
serviçais da ideologia proposta pela dupla Olavo de Carvalho\Jair Bolsonaro, parecem
ter preferido o silêncio.
Ou talvez, como aconteceu com o chanceler, estejam receosos de
precisar usar outra focinheira imposta pelos generais.
* Chefe do DOi-Codi
quando foram registradas 45 mortes e desaparecimentos de presos políticos,
segundo a Comissão Nacional da Verdade, Ustra também costuma ser enaltecido por
Bolsonaro. Na sessão da Câmara que aprovou o impeachment contra Dilma Rousseff,
o presidenciável referiu-se ao torturador como o “terror” da ex-presidenta. Em
recente entrevista ao Roda Viva, Bolsonaro disse que
seu livro de cabeceira era “Verdade Sufocada”, de autoria de Ustra.
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