Sob refletores, Aécio Neves fez um
pronunciamento de mostruário no plenário do
Senado. Peito estufado, soou enfático: “Chamo a atenção desta Casa e dos
brasileiros para o que vou dizer.” As frases saltavam-lhe dos lábios embebidas
de sangue. “Qualquer diálogo tem que estar condicionado especialmente ao aprofundamento
das investigações e exemplares punições daqueles que protagonizaram o maior
escândalo de corrupção da história desse país, já conhecido como petrolão.”
Com loquacidade ensaiada, Aécio aproveitou os mais de 51 milhões de
votos que recebeu dos brasileiros para elevar a estatura da oposição. Longe dos
holofotes, no entanto, o PSDB dialogou com o PT para rebaixar o teto na CPI da
Petrobras. A portas fechadas, tucanos, petistas e Cia. definiram o que não
desejam investigar. No melhor estilo uma mão suja a outra, tiraram de cena
políticos e operadores que estão pendurados de ponta-cabeça no noticiário sobre
o escândalo da Petrobras.
Pelo lado do PT, foi à gaveta o requerimento de convocação do tesoureiro
João Vaccari Neto, acusado de fazer o traslado da propina da Petrobras até as
arcas do petismo. Enfurnaram-se também as convocatórias da senadora Gleisi
Hoffmann e do seu marido, o ministro Paulo Bernardo (Planejamento). Ela foi
apontada como beneficiária de uma youssefiana de R$ 1 milhão para a campanha de
2010. Ele foi mencionado como uma espécie de agenciador.
No jogo de proteção mútua, o tucanato
tirou de cena um potencial depoente chamado Leonardo Meirelles. Trata-se do
empresário que, investido da autoridade de laranja do doleiro Alberto
Youssef, declarou à Justiça Federal ter repassado propinas extraídas de
negócios da Petrobras para o deputado pernambucano Sérgio Guerra, ex-presidente
do PSDB federal, já morto.
Os acertos que transformaram o
discurso de Aécio em palavras cenográficas foram feitos numa reunião a portas
fechadas, antes do início da sessão da CPI. O repórter Gabriel Mascarenhas conta que o deputado
petista Marco Maia, relator da comissão, achou tudo normalíssimo: “Gente, foi
um acordo político, feito por todos os presentes, que se resolveu, em função da
falta de densidade das denúncias, não produzir nenhum tipo de oitiva neste
momento.”
O deputado tucano Carlos Sampaio dançou conforme a música, um chorinho
bem brasileiro: “Decidimos excluir os agentes políticos e os citados nas
delações premiadas. Abrimos mão de ouvir Gleisi e Vaccari. Todo mundo
concordou.” Repita-se, por eloquente, a última frase: “Todo mundo concordou”.
Espanto! De novo: “Todo mundo concordou”. Pasmo! Mais uma vez: “Todo mundo
concordou”. Estupefação.”
No escurinho da CPI, tucanos, petistas e toda a banda muda do Congresso
desistiram também de quebrar os sigilos bancários, fiscais e telefônicos das
empreiteiras acusadas de fraudar contratos na Petrobras. Optou-se, veja você,
por requerer explicações por escrito. Estipulou-se um prazo: dez dias. A CPI
ameaça torcer o nariz de quem desobedecer.
Sempre se soube que empreiteiras enxergam na testa dos políticos apenas
o código de barras. E, de tempos em tempos, surge uma CPI para revelar os
atalhos que levam os congressistas para proveitosos diálogos com potenciais
financiadores.
Horas antes de Aécio discursar sobre
suas condições para o diálogo, Dilma Rousseff dissera no Planalto que, passada
a eleição, é hora de “desmontar ospalanques”. Na CPI, as “condições” e os
“palanques” já sumiram. Ali, tucanos e petistas estreitam a inimizade e exercem
seu último privilégio, que é o de poder escolher seus próprios caminhos para a
desmoralização. Por sorte, sempre que a Polícia Federal e o Ministério Público
entram numa jogada, como na Operação Lava Jato, a promiscuidade pode acabar na
cadeia.
Josias de
Souza em 06/11 05:32 na Folha de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário