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quinta-feira, 18 de junho de 2015

Impasse grego: sem soluções à vista, saída da Zona do Euro ganha força


Há possibilidade do país entrar em um "curso doloroso" em direção ao default e à saída da zona do euro, se o governo e seus credores internacionais não alcançarem um acordo sobre ajuda em troca de reformas. Mais cortes, contudo, não combinam nada com a proposta que levou a Coligação da Esquerda Radical (Syriza) à vitória. Os credores, por sua vez, não dão sinais de recuo. O impasse está montado, só que a polarização entre austeridade e posição antiarrocho transcende o cenário grego. A saída da Grécia renderia grandes desafios ao país, não seria fácil, mas, se tivesse sucesso, poderia influenciar o destino de outros países, apostam especialistas.

Os ministros das Finanças do euro reúnem-se nesta quinta-feira (18), encontro que era apontado como decisivo para um acordo sobre o programa de assistência à Grécia. Cerca de 7 mil pessoas se reuniram nesta quarta-feira (16), na praça Syntagma, no centro de Atenas, para protestar contra as medidas de austeridade e apoiar o governo grego. 
Primeiro-ministro da Grécia, Aléxis Tsípras
Primeiro-ministro da Grécia, Aléxis Tsípras
Os gregos têm até o final de junho para tentar negociar um novo acordo sobre a dívida bilionária com credores. O mês é o último da prorrogação de empréstimo feito pelo Eurogrupo. Entre os principais pontos de desacordo, estão os cortes no número de funcionários públicos e o aumento de taxas. A próxima tentativa para se chegar a um acordo seria a reunião de líderes da Zona do Euro,  no dia 25 de junho. No dia 30, a Grécia terá que pagar 1,6 bilhão ao FMI.
De acordo com o Banco Central grego, a desaceleração econômica do país deve se ampliar no segundo trimestre. "Não alcançar um acordo vai (...) marcar o início de um curso doloroso que levará inicialmente a um default grego e, no fim, à saída do país da zona do euro e, mais provavelmente, da União Europeia", disse o banco central grego em relatório.
O Syriza foi o primeiro partido anti-austeridade a assumir a direção de um país europeu, em janeiro. “A Grécia está virando uma página, deixando para trás cinco anos de humilhação e dor. Hoje, a troika (grupo que impôs medidas de austeridade) é coisa do passado”, disse o líder do Syriza que se tornaria o primeiro-ministro da Grécia, Aléxis Tsípras, em janeiro. 
Tsípras informou no início da semana que as negociações com credores no último domingo foram paralisadas ante as demandas para uma nova rodada de cortes nas pensões. "Isso não é uma questão de impertinência ideológica, é sobre democracia. Vamos esperar pacientemente que as instituições vejam a realidade." 
Queda de braço 
O ajuste imposto à Grécia após a crise econômica tem levado a quedas muito grandes no nível da atividade econômica do país, destaca o professor do Instituto de Economia da UFRJ, Luiz Carlos Prado. A situação até melhorou um pouco, mas tem se estabilizado em um nível muito baixo. Neste cenário, os ajustes adicionais exigidos à economia grega só iriam piorar ainda mais a situação, completa o professor. Além disso, sob o ponto de vista político, a situação fica cada vez mais insustentável. 
"Então você tem, efetivamente, um impasse. É prematuro dizer que a Grécia vai sair compulsoriamente [da Zona do Euro], embora as notícias indiquem que a Europa está se preparando para isso. Se preparando como?", questiona Prado.
Entrando em default, a Grécia não só ficaria impossibilitada de pagar essas dívidas, não como conseguiria realizar outros pagamentos. Embora se trate de uma economia pequena, o estrago de umdefault seria grande.
"O que você tem aí é uma queda de braço. A Grécia está levando até o final apostando que, ao final, a União Europeia não vai querer que ela chegue à situação de default, e a União Europeia está levando no limite, para tentar forçar o governo a aprovar o que eles desejam. Então, a questão a saber é que vai ceder primeiro".
De acordo com Prado, a Alemanha deve fazer o possível para manter a Grécia na Zona do Euro. Renegociar as condições, entretanto, que é a demanda da Grécia, "eles não querem fazer". Por outro lado, se o governo grego cede ás exigências da Europa, fica desmoralizado, porque foi eleito sob a agenda de conseguir alterar a negociação. 
Maria Beatriz de Albuquerque David, professora do Departamento de Ciências Econômicas da Uerj, salienta que o impasse já era previsto, porque o governo grego foi eleito com uma plataforma justamente de não aceitar a continuação da política de ajustes, prometendo que aumentaria pensões, as aposentadorias, e agora enfrenta uma dicotomia entre o eleitorado e viabilidade da dívida. 
"A Grécia ainda precisa de 7 bilhões de euros para pagar, inclusive, ao FMI no final do mês. Mas se ele aceita um compromisso de aprofundar as reformas, ele vai estar indo contra o que prometeu. Por outro lado fica inadimplente, e a população grega não quer que o país saia da Zona do Euro. Então, a bola fica muito mais do lado do governo da Grécia", aponta Maria Beatriz David. 
O pesquisador Aldo Cordeiro Sauda, especialista em relações internacionais, chama a atenção para o fato de que o Syriza é uma coligação ainda frágil e pequena. Não tem, por exemplo, uma estrutura de apoio como tem o PT no Brasil. Há o risco do partido sofrer um racha por causa das políticas do primeiro-ministro. Sauda lembra que todas as tentativas de achar uma saída negociada, inclusive, foram  muito criticadas dentro do próprio partido.
"O cálculo que o Tsípras está fazendo agora é o seguinte, eu vou dar o maior estelionato eleitoral da história? Porque é isto, se ele aceita a proposta da União Europeia", explica Sauda. "O Tsípras então também está pensando na ala à esquerda do partido dele, que está colocando pressão. E ele não pode aceitar um racha, porque o partido é frágil ele não tem um aparato político, é só ele."
Tsípras tem recuado sempre, só que ele chegou talvez num ponto que não tem mais como recuar nem para onde ir, acredita Sauda. Ou ele rompe de vez com a União Europeia ou acaba com todo um processo que tem se desenhado não só na Grécia mas em toda a Europa. Se a Grécia sair efetivamente do grupo e ficar melhor economicamente daqui a dois anos, "todo mundo vai romper com a União Europeia", acredita o pesquisador.
Polarização transcende cenário grego
Sauda lembra que o programa vitorioso na Grécia, que visa essencialmente acabar com a austeridade, também pode sair vitorioso na Espanha, com o Podemos, e que também está se desenvolvendo em outras coalizações, como, por exemplo, na França, na Itália. "É uma polarização que transcende o recorte Grécia de um lado e a União Europeia do outro. É um processo político de uma questão em torno da austeridade".
Uma saída da zona do euro que rendesse frutos positivos para a Grécia seria uma vitória histórica para o Tsípras e também para todo um modelo partidário que está surgindo, indica Sauda -- isso tudo em um cenário fértil para alternativas políticas, inclusive, vide casos como o do partido Aurora Dourada, que é neo-nazista e conquistou espaços antes inimagináveis. 
O professor Prado também salienta a possibilidade de, depois de uma saída da Grécia, outros países maiores terem um problema similar e resolverem pelo mesmo caminho. "À primeira vista, parece não ser o caso, os outros países conseguiram se equilibrar de alguma maneira. Agora, é um precedente perigoso, então a situação ainda é muito incerta."
Grécia fora da Zona do Euro
A população grega diz que quer continuar na zona do euro, mas não aceita mais a austeridade. "Ela vai ter que fazer uma escolha entre os dois. O problema é que ela tem medo de sair do euro e não saber que vai acontecer. Ela não sente segurança, mas ela está caminhando para outra direção, porque que a situação só piora", diz Sauda.
O pesquisador defende que seria melhor para a Grécia sair da zona do euro. Posição, ele completa, compartilhada por outros economistas ao redor do mundo. "Eventualmente, [a Grécia] vai ter que sair do euro, se for para sair da austeridade, se for para ser coerente. Ou vai ter que dizer 'continuamos a austeridade'. Se fizer isso, quebra o Syriza. O Syriza é um ator racional, o Syriza não quer quebrar."
Prado reforça que não é muito claro o tipo de impacto esta saída causaria na União Europeia. O peso da Grécia é muito pequeno, sob o ponto de vista da economia europeia, mas seria o primeiro caso de saída compulsória de um país do euro. Organizar uma outra moeda para o país, por exemplo, seria um processo complexo. Além disso, há a questão das dívidas, se continuariam em euro.
"A situação é muito complicada, não está muito claro ainda como essa questão vai ser resolvida. É bem possível que nesses próximos 15 dias se chegue a algum tipo de acomodação. Algum tipo de acomodação eu não acho impossível", diz Prado.
Maria Beatriz destaca que a saída geraria um situação ruim para os bancos alemães, e que a Grécia, por ser uma economia pequena, não faria grande diferença para a Europa. "Os grandes perdedores seriam os bancos alemães."
Jornal do Brasil Pamela Mascarenhas

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