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terça-feira, 27 de março de 2012

Mauricinhos, amestrados e desempregados



Gilmar Mendes: um capítulo lamentável do STF
Gilmar Mendes, quando presidente do Supremo, detonou a profissão de jornalista. A partir dessa decisão qualquer um que tivesse cometido um poema num jornal do interior poderia jactar-se de ser “jornalista.” Mesmo não tendo cumprido o ritual de praxe, no caso a apresentação de um diploma de terceiro grau na área de comunicação.

Os jornalistas (o que vos envia essas palavras não tem diploma porque na época as faculdades de comunicação não existiam) chiaram muito, talvez não com tanta razão assim.

A profissão mudou muito. Meu avô, Attico de Oliveira Rocha, nos tempos do Diário da Noite, A Noite e outros jornais do começo do século passado era mais respeitado pela profissão que exercia do que meu pai, Hélio Ferreira Rocha, veterano da sessão de esportes do Correio da Manhã.

Mas sempre havia um pouco mais de  espaço para a opinião pessoal. A pauta era menos rigorosa e o repórter não era obrigado a seguir, até nas vírgulas, a voz do dono. Ou do editor acima dele, no meu caso.

Na redação do Correio, transitava gente como Otto Maria Carpeaux, José Lino Grunewald, Paulo Francis e outros nomes de respeito do jornalismo. No passado, no mesmo jornal, Graciliano Ramos foi chefe do copy desk, Oliveira Viana era colunista e o Correio tinha opinião própria, a gente gostasse ou não.

Eram tempos em que a venda de cada exemplar nas bancas era importante e a sobrevivência estava menos atrelada aos anunciantes.
A oligopolização da mídia impressa (e das outras plataformas idem) pôs um ponto final nesse espaço de liberdade do profissional da notícia. Hoje o “jornalista independente” é o que está desempregado. Ou, quando muito, é o que opina na internet.

Ruim para a profissão – blogs e sites surgindo aos milhares não remuneram ( ou remuneram mal) o jornalistas. Bom para o respeitável público, porque esse contraponto, em rápido crescimento, vai tornando complicada a vida dos jornalões e emissoras de TV corporativas.   A “verdade” da mídia já pode ser contestada em dois ou três movimentos do mouse.

Já lá se vão alguns anos entrei na redação de O Globo, meu local de trabalho no final dos anos 60. Foi um choque. A troca da guarda: saíram os repórteres de ternos baratos, gravatas meio amassadas e salários de envergonhar, geralmente cumprindo nos jornais a segunda fase da dupla jornada e entram os mauricinhos.

A velha redação onde os janelões eram abertos para que entrasse o ar quente da noite carioca e onde se falava mais ou menos aos berros sob o barulho infernal da olivetes e undewoods,  era agora um silencioso mosaico de jovens bem vestidos, usando óculos de grau caros para os padrões do antigamente.

Desapareceram gritos e palavrões e, principalmente, a consciência da exata dimensão do que fazíamos ali: Claro, estávamos no Globo, jornal conservador, avesso à pluralidade, à diversidade de opiniões, a tudo o que cheirasse a povão, até mesmo nas páginas policiais: crime de “pé inchado não entra.”

Tudo bem, trabalhávamos num jornal conservador, todos estavam conscientes disso. Mas essa consciência crítica exalava nas conversas pela madrugada nos bares próximos da sede do jornal.


 Talvez a quantidade de bebida ingerida tivesse uma relação direta com essa dicotomia: a maioria de nós conhecia a ditadura da pauta preparada  e ficávamos ali escrevendo sobre uma realidade em que nem de longe acreditávamos.

Texto: José Attico

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